Hoje compartilho minhas solidões com Mirian Francisco dos Santos, genial poeta-aluna da "Novas Letras", Oficina de Técnicas de Produção Textual da EJA (Educação de Jovens e Adultos) idealizada por mim no ano passado e que, neste semestre, encerra sua terceira edição hoje, sempre buscando revelar talentos do ensino noturno. E um dos maiores talentos desse semestre foi Mirian Francisco (como ela assina nos poemas que me entrega) ou Mirian Santos (como ela se apresenta no facebook). Sua escrita poética e apurada, riquíssima em figuras de linguagem (anáforas, gradações, hipérbatos, metáforas, etc) possui uma atmosfera asfixiante ao estilo de Kafka e um desespero lírico de deixar grandes poetas como Ana Cristina César e Hilda Hilst morrendo de inveja. O grande porém que Mirian nos traz é outra característica que essa poeta tem em comum com o escritor tcheco Franz Kafka (1883-1924): ambos, em suas intensidades delirantes-poéticas, são extremamente autocríticos - fato comum em grandes talentos - e vivem em crise com seus talentos (assim como o autor da obra-prima "A metamorfose", Mirian, volta e meia, ameaça queimar todos os seus escritos). Desesperado com o risco destrutivo desse porém que essa talentosa poeta-aluna carrega, o professor-poeta que vos fala implorou e - num ato de pânico pela morte do lirismo imenso que a moça possui - chegou a sequestrar os poemas da artista, para que estes não fossem vítimas do fogo delirante da extrema autocrítica dela. Depois de muita insistência minha (com arte, sou mais teimoso que Dom Quixote de La Mancha é com sua Dulcinéia), ela cedeu e permitiu que eu publicasse um de seus poemas. Então, leitores, aí vai um poema de talento raríssimo e estilo desesperado e único, nos relembrando os dramas daqueles que, contra a onda massificante, navegam pelas loucas paixões poéticas. Quem gostar, por favor, comente e ajude esse professor-poeta a convencer a kafkiana Mirian de que sua arte é tão primorosa quanto a dos leitores que ela lê (sei que isso deve ser resolvido por ela dentro dela, mas não custa a gente elevar o ego dessa grande poeta).
Perdida com os
meus pensamentos,
quero entender
por que me sinto
tão só.
São tantas pessoas
a minha volta,
todos riem, conversam,
mas... me sinto só...
aguardo ansiosa e penso...
Vou falar, comentar
sobre o livro que li,
de mostrar o poema
que escrevi...
mas não dá:
o assunto é bolsa, sapatos,
batom, lojas e esmaltes
e eu não entendo;
do outro lado,
ouço falar sobre
carros, bolas, jogos,
mulher e confusão
e minha mente gira,
não ouço um comentário
sobre livros,
me sinto ridícula
e muito só,
estou desatualizada,
fora de moda,
vivo entre livros
velhos e empoeirados,
páginas amarelas,
não tenho com quem falar,
sobre poemas ninguém
quer ouvir.
Chamaram-me de louca
quando mostrei
um livro velho
do Álvares de Azevedo,
mostraram-me minha idade
e disseram:
“Tem que estudar pra abrir
a mente, e não para agir
como louca”,
e, com isso, surgem as lágrimas
que tento conter
sem muito sucesso,
sinto-me insegura...
mas o sonho continua,
quero ler, ler e escrever,
sonhar... sonhar e voar!
Ahh, que bom que conseguiste publicar o poema! A Mirian possui intensos eus líricos guardados em sua alma e não deve escondê-los de nós, a poesia não deve ser trancada e, se for pra ser queimada, que queime em nossos olhos sedentos por novas metáforas, sonhos e voos!!!! Sim, o sonho tem que continuar sempre, Mirian! Parabéns!
ResponderExcluirNão será preciso ser poeta, para voar com esta grande ave; nem se necessita ser acadêmico para entender de vôos sem asas, entre milhões que se arrastam podendo escolher viver. Fiquei impressionado ao ler tão somente esse trecho de Mirian Santos. Essas sim que são palavras que saem do ninho de um coração puro, e não inventadas por mestres mortos da academia da retórica. a Net está se asfixiando de tantas palavras mortas que matam, enquanto simples mortais como Mirian, sabem resgatar valores e criar com eles um planeta de paz que pulula por cima de nós, por não achar corações que reconheçam a sua pobreza de alma, e o deixem pousar na nossa febril humanidade sem ar. Parabens para essa mulher especial, e também para você Bruno, que sabe ler no silencio das palavras, o que o coração o diz gritando.
ResponderExcluirNossa... lindo. Putz... acho q todo amante de Literatura e de arte já se sentiu, ou se sente assim de vez em quando, sozinho e perdido sem ter quem entenda por que reagimos de forma tão maravilhada quando descobrimos um velho novo livro ou um velho novo filme. É realmente muito ruim, mas a arte vence , ela sempre dá seu jeitinho de ficar na nossa cabeça e nos faz querer mais e mais dela. Mesmo sem ng pra compartilhar, mesmo com todo mundo achando a gente louco! A arte é marca indelével, dói, mas salva.
ResponderExcluirCarlos, diga a Miriam que seja bem vinda ao clube dos "desentendidos" no mundo vulgo "normal". Assim como ela, em meio a multidão, numa festa, não sabia falar, entediava-me pelo mesmo assunto do qual ele fala, me fizeram, em uma festa, uma única pergunta - que eu achava que tinha respondido a contento - engano, nem tenho coragem de dizer o significado da pergunta (fui ingênua), quando o pai de meu filho veio me traduzir, tao embaraçoso que não frequentei mais as festas dos vizinhos e quando retornei, decidi não falar, apenas rir, o que quase me deixou com "ler" no maxilar.
ResponderExcluirenfim, nada disso tem a menor importancia, o importante é que voce nos trouxe Miriam. diga-lhe que minha casa-laptop está aberta a ela e seu belos e angustiantes poemas urdidos no desespero da não-comunicação, do não pertencimento com s outro. Quando li a metamorfose a impressão que até hoje tenho, é que Kafka se implodiu emocionalmente.
eu só não sei se ela vai querer falar comigo, sou tagarela, matraca, etc. voce já deve ter percebido (rsssss)
Ueeba! Mais uma poeta para me encantar com seus textos, sensações, reflexões e emoções. Obrigada por compartilhar seus textos, querida Mirian Santos! E você, Professor-Poeta, Carlos Brunno, que continue a semear!
ResponderExcluir