Mais uma vez, às vésperas das vésperas do Natal, nos vemos cada
vez mais cínicos e castos nas trevas coloridas de nossas festividades de fim de
ano. Neste momento tão especial, relembro aos queridos leitores que, há muitos
anos, em 23 de dezembro de 1636, nasceu o escritor brasileiro Gregório de
Matos, mais conhecido pela hipócrita sociedade colonialista brasileira como o
“Boca do Inferno”. Relembro também que, em 23 de dezembro de 1888, o pintor
pós-impressionista holandês Vincent Van Gogh corta sua orelha esquerda, a leva
para um bordel e a dá a uma prostituta chamada Rachel. Em homenagem ao
nascimento de Gregório de Matos (e a pedidos da leitora Helene Camile, que me
pedira pra lembrar deste polêmico poeta) e à orelha de Van Gogh, presenteio os
leitores com mais um poema inédito, a ser publicado em meu próximo livro
“Foda-se e outras palavras poéticas” (previsto para ano que vem, a mais nova
data do velho fim do mundo); um presente poético e indigesto como os
homenageados.
A orelha lírica de Van Gogh
(ou A orelha de Van Gogh versejada por Gregório de Matos)
Uma orelha corto em vosso garbo
Como correção de meu autorretrato;
Dou arte a sábio e tolos
Assim como dais o rabo
A tarados e solitários.
Que minha orelha penetre em vosso quarto
Como presente de Natal amável e alucinado;
Escutarei sussurros de vossos amantes
E terei, em vossos tristes prostíbulos,
O lirismo mais sincero e mais errante.
Que minha orelha penetre em vossa ceia tétrica
Ao invés dos perus desconhecidos dos donos da ética,
Que, vestidos de moral e cívica,
Vos penetram de forma cínica;
A esses pintarei a pintura mais íntima e suicida.
Celebremos, Rachel,
Com minha orelha e o vosso rabo de mel
A festa lírica dessa nossa eterna lua de fel.
Adorei essa mistura do não-orgânico que tem vida, Deleuze trata tão bem desse tema na perspectiva cinematográfica.
ResponderExcluirO não-orgânico tem uma potencialidade de dizer o que o vivo nao tem coragem. É como a instancia de Memórias Póstumas de Brás Cubas, depois de morto, tem autoridade para dizer tudo o que não tinha enquanto vivo.
agora a relação entre raquel e a orelha de Gogh muito bacana. a lua de fel, ambos num mundo tão bizarro, em que a bizarrice se dar por conta da pressão que o "normal" da sociedade é tão deformado que o pintor não consegue suportar e surta, assim como a prostituta, que é um banco-poupança depositário das misérias e recalques dos ditos normais aleijados por uma moral aceita apenas da boca pra fora.
o eu lírico se distancia como uma consciencia onisciente.
hummmmmmmm eu adoro viajar na maionese e fazer uma salada mista, pois sempre fui agitada da mente (um eufemismo para não dizer louca rsrsrs).