domingo, 4 de setembro de 2011

Poema inédito: Eu policarpo meu mundo


Depois de algumas postagens otimistas, minha bipolaridade resgata o pessimismo adormecido na viagem desastrada pelas margens de uma cidade perdida, às vésperas das festas da Independência de um Brasil que nunca foi livre. Todos comemoram a vida, a vitória de seu time, mas o ar continua sujo e ninguém assiste as lágrimas do torcedor derrotado do outro lado. A festa cultural do aniversário de Valença se aproxima e relembro que continuo excluído, os políticos corruptos continuam sendo ‘inocentados’ e todas as vozes que podem reclamar um mundo melhor assinam contratos bem pagos de silêncios massificados. Meu ex-professor Fábio Elionar me lembrou ontem que o vazio não é só nosso; é do mundo todo. Lembrar dele me fez retomar a leitura do livro “Triste fim de Policarpo Quaresma”, de Lima Barreto. O livro, quase que totalmente ignorado em sua época, tornou-se um marco da Literatura Brasileira e o precursor do Modernismo ‘tupiniquim’, movimento que, aos poucos, libertou nossa arte das amarras dos modelos europeus. A obra de Lima Barreto é protagonizada pelo personagem Policarpo Quaresma, um patriota extremista e ingênuo que busca desastrosamente dar identidade e transcender um Brasil corrompido. As desventuras do protagonista culminam em sua morte – o mundo não admite heróis que carregam a bandeira da pureza; os nobres ideais são sempre postos na frente de um pelotão de fuzilamento, sem direito a absolvição. O poema inédito que posto hoje é dedicado ao meu professor Fábio Elionar, ao triste fim de Policarpo Quaresma, ao Lima Barreto e ao direito de todo ser pensante de ficar triste e pessimista, de vez em quando, mesmo que o sol enganosamente ameace alegrar o solo sem sonhos:   

Eu policarpo meu mundo

Vai, Policarpo, beijar teus esqueletos do passado
com lábios putrefatos.
Yeah, Policarpo, vai tocar rebu desafinado
contra o muro lapidado
(surdo, o mundo te ouvirá calado).
Sim, Policarpo, teu samba é apático,
pois os vultos morenos estão cansados.
Oh, Policarpo, jaz em ti um jazz mutilado
pelo tédio mortificado
(imundo, nenhum ritmo brasileiro será tocado).
Volta, Policarpo, pro teu universo obituário
de cadáveres atestados.
Adeus, Policarpo, retorna pro livro empoeirado
com teus capítulos desastrados
(obtuso, o teu romance será negado). 

Um comentário:

  1. O pessimismo só não deve nos impedir de plantar a semente do bem, nem de sonhar, mesmo que tudo pareça uma grande escuridão. Aí está a grande diferença q os poetas fazem, enxergam, sofrem, gritam e até mesmo seu silêncio incomoda. Compartilho essas solidões pessimistas... Grande abraço.........

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