segunda-feira, 7 de novembro de 2011

Poema fora de moda: Conversa ao luar

Hoje, dia 7 de novembro, comemora-se 94 anos da Revolução de Outubro, golpe de estado liderado por Vladimir Lenin e pelos bolcheviques, contra o governo provisório na Rússia, em 1917 (isso ocorreu em 25 de outubro de 1917, pelo calendário juliano, data equivalente ao 7 de novembro pelo nosso calendário gregoriano). Esse evento foi a primeira revolução comunista marxista do século XX e deu o poder aos bolcheviques. Tal data coincide com a data de nascimento de Leon Trotski (1879), revolucionário russo e fundador da IV Internacional. Relembrar tais fatos, nos dias atuais, é como rememorar acontecimentos remotos, impossíveis de serem compreendidos pelas novas gerações (estão 'fora de moda' e quase totalmente abolidas do dicionário as palavras 'revolução', 'marxismo' e 'poder ao povo' - a última expressão citada, sinceramente, apesar de tal revolução citá-la, permaneceu e continua numa abstrata e absoluta teoria utópica; vive sorumbática somente no mundo das ideias, invisível em quaisquer sistemas de governos humanos). Nas trevas coloridas em que vivemos, os sorrisos alienados ocultam uma realidade escrota, individualista e exploratória. As tentativas de luta por um mundo melhor foram anestesiadas pelo "deixa disso, viva como der que não tem jeito", "sorria que você está sendo filmado e, se for engraçado, o seu vídeo pode estourar no youtube", "se vira nos 30 dias, tá difícil, mas a vida é assim mesmo!" ou "grite no twitter e sobreviva calado". Vivemos um período esvaziado de ideais; parafraseando e modernizando Cazuza, 'ideologia - não existe mais nenhuma pra se ver'. 
Diante dessa falta de perspectiva, mais clara ainda quando vejo a escuridão melancólica ensaiada nos sonhos quase sempre sem rumo de cada amigo e aluno, trago mais um poema inédito, já selecionado para meu próximo livro "Foda-se e outras palavras poéticas" (previsto para 2012, o mais novo ano do 'fim do mundo' que nunca acaba). "Conversa ao luar" é como seu título já sugere: um bate-papo romântico com fantasmas do passado, lamentando o presente noturno sem expectativas de um amanhecer totalmente novo. Lamento à sorridente galera do 'deixa disso', mas só por hoje eu não quero mais sorrir diante dos estragos da nossa eterna falta de perspectiva. Amanhã volto a acender o meu cigarro no incêndio, mas hoje eu só lamento as queimadas impunes dos novos tempos:


Conversa ao luar

“Desdenhavam do amor
faziam ninhos de serpentes no quintal
discutiam filósofos marxistas
brincavam com as sombras dos coelhos”
Renata Pallottini, “Os loucos de antes”




Dentes carentes na direção do pão dormido,
caminhávamos no domingo insensível
em busca de um poema.

Encontrávamos apenas pedras aflitas e macias
esquecidas sobre a cabeça bêbada
do mendigo ridicularizado e vadio.

Metáforas e histórias morriam em nosso silêncio.
Quem falava era apenas o vento:
“A derrota é o caminho, a derrota venceu!”

Ombros caídos sobre o peso das estrelas extintas:
“Lembra da constelação vermelha, Marx?
E daquelas estrelas à esquerda, Bakunin?”

Parávamos diante da lua
e admirávamos sua falta de luz própria
- brilhante vazio, sublime ilusão.

Quando uma lágrima nos ameaçava,
partíamos sorrindo: “Já estamos carecas de saber, Zacarias”
“A vida é uma piada muda, Chaplin”

Então nos despedíamos: “Boa Noite, Aurora!”
“Bons sonhos, Pesadelo”
“Dormiremos profundamente, Bandeira.”

E agora descansamos,
descansamos
porque amanhã é segunda-feira.      

2 comentários:

  1. As famosas frases feitas, "não tem mais jeito", "a vida é assim", infelizmente a inércia toma conta das pessoas, estão ficando cada vez mais cegas, afinal, quem gostaria de se levantar da sua poltrona para tentar mudar alguma coisa? Deveríamos começar pelo nosso discurso, as palavras têm poder sim, a vida pode ser melhor e o mundo também!

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  2. "Quem fala em revolução, mas não a pratica cotidianamente, tem na boca um cadáver" (grafite de Maio-68.

    "escutai,
    camaradas futuros,
    o agitador,
    o cáustico caudilho,
    o extintor
    dos melífluos enxurros:
    por cima
    dos opúsculos líricos,
    eu vos falo
    como um vivo aos vivos.
    chego a vós,
    à comuna distante,
    não como iessiênin,
    guitarriarcaico.
    mas através
    dos séculos em arco
    sobre os poetas
    e sobre os governantes.
    meu verso chegará,
    não como a seta
    lírico-amável,
    que persegue a caça.
    nem como
    ao numismata
    a moeda gasta,
    nem como a luz
    das estrelas decrépitas.
    meu verso
    com labor
    rompe a mole dos anos,
    e assoma
    a olho nu,
    palpável,
    bruto,
    como a nossos dias
    chega o aqueduto
    levantado
    por escravos romanos.
    (...)
    desdobro minhas páginas
    – tropas em parada,
    e passo em revista
    o front das palavras.
    estrofes estacam
    chumbo-severas,
    prontas para o triunfo
    ou para a morte.
    poemas-canhões, rígida coorte,
    apontando
    as maiúsculas
    abertas.
    ei-la,
    a cavalaria do sarcasmo,
    minha arma favorita,
    alerta para a luta.
    rimas em riste,
    sofreando o entusiasmo,
    eriça
    suas lanças agudas.
    e todo
    este exército aguerrido,
    vinte anos de combates,
    não batido,
    eu vos dôo,
    proletários do planeta,
    cada folha
    até a última letra.
    o inimigo
    da colossal
    classe obreira,
    é também
    meu inimigo
    figadal.
    anos
    de servidão e de miséria
    comandavam
    nossa bandeira vermelha.
    sob o nosso projétil,
    debandava o burguês
    que antes nos debandara.
    que essa viúva desolada,
    – glória –
    se arraste
    após os gênios,
    merencória.
    morre,
    meu verso,
    como um soldado
    anônimo
    na lufada do assalto.
    cuspo
    sobre o bronze pesadíssimo,
    cuspo
    sobre o mármore viscoso.
    partilhemos a glória, –
    entre nós todos, –
    o comum monumento:
    o socialismo,
    forjado
    na refrega
    e no fogo.
    vindouros,
    varejai vossos léxicos:
    do letes
    brotam letras como lixo –
    "tuberculose",
    "bloqueio",
    "meretrício".
    por vós,
    geração de saudáveis, –
    um poeta,
    com a língua dos cartazes,
    lambeu
    os escarros da tísis.
    a cauda dos anos
    faz-me agora
    um monstro,
    fossilcoleante.
    camarada vida,
    vamos,
    para diante,
    galopemos
    .......pelo qüinqüênio afora(2).
    os versos
    para mim
    não deram rublos,
    nem mobílias
    de madeiras caras.
    uma camisa
    lavada e clara,
    e basta, –
    para mim é tudo.
    ao comitê central
    do futuro
    ofuscante,
    sobre a malta
    dos vates
    velhacos e falsários,
    apresento
    em lugar
    do registro partidário
    .todos
    os cem tomos
    dos meus livros militantes." (Maiakvsky)

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