Nossos heróis continuam morrendo de overdose; os papas agora
são latinos, mas trazem os mesmos passados obscuros e os mesmos retrógados
ensinos; o Brasil se declara potência emergente e os estrangeiros ainda
acreditam que Buenos Aires é a capital brasileira habitada por índios; o sonho
americano permanece comprando as almas dos povos; as drogas continuam dançando
no salão contemporâneo, levando o mundo pro infinito sem destino; a fome
continua; o tédio continua; o cansaço aumenta; os suicídios aumentam; a vida
descansa e a morte desfila na passarela dos vivos. Enquanto isso, ouço Bob
Dylan, atemporal (“It's All Over Now, Baby Blue”), lembro de Chorão, ainda
recente (“Difícil é desviar de quem tá sempre querendo / ela mantém a porta
aberta, ela te faz de instrumento, / vai te dominar, se já não dominou”), imagino
o escritor beat Burroughs, em suas constantes viagens alucinógenas, sentindo a
impossibilidade do “American Dream” e me pergunto por que Rimbaud parou de
escrever, após tantos momentos geniais. O resultado está aí embaixo, um poema
alucinado que teme a alienação da alucinação:
Não tem mais graça, Baby Beat
Ah, Baby Beat, como vão
seus filhos abortados,
mortos de fome, mortos de tédio,
mortos do cansaço
de ir e vir pela sala sem estar?
Em frente à tevê,
eles parecem navegar,
mortos vivos querendo se matar,
marinheiros de olhos marejados
encontrando o horizonte em nenhum lugar,
embarcando em Buenos Aires,
capital imaginária do Brasil dos gringos,
recheada de papas homicidas
e índios assassinos.
Ah, Baby Beat, como está sua vida?
Ainda tens aquela fonte de juventude
no jardim ao lado da piscina suicida
ou deixaste a água jovial secar
na poeira de pó que alucina?
Com tantas fragrâncias divertidas,
como podes chorar, Baby Beat?
Teus lagos de loucura inundam
os desertos de trôpegos Rimbauds perdidos
e lembram que a chuva insana
é apenas condição humana
da nova geração
da falta de geração,
mas não vou chorar contigo mais, Baby Beat.
O pesadelo da Bela Adormecida
é acordar pra vida,
mas essa luz opaca de realidade aflita
ainda me brilha
muito além da tua insanidade travestida.
Por isso que não durmo mais
nessa cama de felicidade frígida, Baby Beat.
Pode dormir sozinha, ex-amor;
prefiro seguir pela estrada infeliz
que insistir em assistir à dor
de teu sorriso triste,
molhados pelas lágrimas que insistem
em cair de teus olhos alucinados.
A realidade machuca, mas ela está lá,
pedindo trocados de uma poesia menos fingida,
e não posso mais chutá-la, Baby Beat.
Pode dormir pra sempre, ex-amante amiga,
que eu preciso seguir em frente.
Enlouquecer já perdeu a graça, meu ex-amor,
Digo-te adeus, Baby Beat,
E me vou.
Olá Carlos. Fico feliz com sua visita e que tenha gostado do meu poema. =)
ResponderExcluirÉ difícil acreditar nessa realidade bizarra que estamos vivendo. Parece até um pouco irreal, não? Talvez seja por isso que muitos perdem a inspiração e dizem adeus.
Uma ótima semana
Abraço