O incêndio do Museu Nacional no Rio de Janeiro/RJ me trouxe uma
sequência de lembranças ruins: me lembrei do Casarão das Artes na subida da
Catedral em Valença/RJ, incendiado e cujas vergonhosas ruínas aparecem como –
pasmem – ‘atração turística’ da cidade; me lembrei do Museu da Língua
Portuguesa de São Paulo, ainda cicatrizando suas queimaduras (conhece?); me
lembrei de uma visita recente ao esvaziado museu dos correios bem no centro, no
coração agitado de Niterói/RJ (quando lamentamos a perda de alguém, será que
nos perguntamos há quanto tempo não o visitávamos?(; me lembrei do sucateamento
da nossa cultura, da nossa falência de sabedoria e de compreensão histórica; me
lembrei de eventos culturais recentemente vazios (Choramos a perda do que há
tempos não vimos? Choramos os nosso vazios?); me lembrei como há tempos não
visitava a região da Quinta da Boa Vista, sempre com medo da falta de
segurança; me lembrei dos descuidos dos desgovernantes mal eleitos pelo povo (e
com grandes chances de retornarem nas próximas eleições; me lembrei dos
candidatos que queimam nossa História com histórias fakes minúsculas, que são
exaltados pelo povo; me lembrei de Farenheit 451, de Ray Bradbury (você já leu
ou já assistiu à excelente versão cinematográfica , dirigida por François
Truffaut [tem uma nova versão também, a
qual ainda não assisti – mas pretendo assistir - , por sinal, pouco divulgada
entre as diversas [nada contra, mas só falam disso?] guerras infinitas)ou só
ouviu falar ou nunca nem viu e tem raiva de quem viu, leu, etc, e estou sendo
pedante demais como se declarar-me leitor é o mesmo que se declarar arrogante, ‘comunista
doutrinador’ [aff] entre outros
adjetivos pejorativos, mesmo quando o pejorativo não tem nada a ver com a
questão a menos que se enxergue a carga de ironia que envolve essa digressão?
[foi mal/fui mau; não ando muito polido ultimamente]); me lembrei das lágrimas
forçosas dos crocodilos e finalmente me lembrei de que em breve esqueceremos
isso tudo até vir outra tragédia que trará outra comoção coletiva, que unirá os
povos contra culpados em 2.ªs pessoas (sois sempre vós os culpados, nós não
temos nada a ver com isso) e que, com o tempo, será novamente esquecida,
enquanto a cultura definha, enquanto continua a despolítica, a antidemocracia,
a desculturação, a desorientação nacional.
Diante de tudo isso, escrevi o poema abaixo, me lembrando de que 44% da
população brasileira não lê e 30% nunca comprou um livro, segundo aponta a pesquisa
Retratos da Leitura, realizada em 2016 (“O índice de leitura, apesar de ligeira
melhora, indica que o brasileiro lê apenas 4,96 livros por ano – desses, 0,94
são indicados pela escola e 2,88 lidos por vontade própria. Do total de livros
lidos, 2,43 foram terminados e 2,53 lidos em partes” – fonte: https://cultura.estadao.com.br/blogs/babel/44-da-populacao-brasileira-nao-le-e-30-nunca-comprou-um-livro-aponta-pesquisa-retratos-da-leitura/
).
Boa leitura e Arte Sempre – ainda que carbonizada, enlutada,
desfigurada, violentada, arrasada ...
Museu das formas nominais nacionais do Verbo
Anteontem era esquecimento
Parente nobre, de história bonita lembrada por sussurros, deixado no
canto do asilo da memória com mal de alzheimer, infinitivo impessoal
Ontem foi chama letal e labaredas de lágrimas, crônica de tragédia
anunciada, mas que poucos anunciaram (o asilo da memória com mal de Alzheimer
num instante de espanto e lucidez), gerúndio de perdas
Hoje é ídolo morto lamentado, corpo cremado espalhando cinzas na culpa
oculta de cada olhos castanhos, negros, verdes e azuis, mais um canto coletivo
de hino nacional cultuado cuja letra de sentidos figurados ainda é
incompreendida na voz rouca, entristecida e intransitiva de cada um, choro
crocodílico, particípio da ignorância proclamada, profundamente mascarada e
enrugada
Amanhã será não será,
Depois de amanhã novo não lembrar
Até outro esquecer,
Até um novo velho queimar
E nós novamente impunemente relembrar, chorar
E novamente esquecer,
Infinitivo pessoal de seres que não sabem o que serem ou não serem
Apenas chorar sem se culpar, sem se entender
Apenas chorar sem querer
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