quinta-feira, 21 de março de 2019

No Dia Mundial da Poesia, deixo meus olhos leitores penetrarem (e serem penetrados) pelo lirismo de Jardim


Hoje, dia 21 de março, como bem me lembrou o super mais que fodástico poetamigo Sergio Almeida, mais conhecido como Jardim, comemoramos o Dia Mundial da Poesia. Diante de data tão especial, nada mais apropriado que compartilhar minhas solidões poéticas na postagem de hoje com uma pequena (pequena, no sentido de quantidade, de leitura com desejo de ler mais; imensa, em seu esbanjamento lírico, grandiosa em sua plenitude e – principalmente nos dois últimos – sensualidade) seleção de 3 poemas do próprio  super mais que fodástico poetamigo Jardim.
O super mais que fodástico poetamigo Sergio Almeida, o Jardim, é um artistamigo multipremiado em diversos certames literários e tem vários livros publicados (“Filhas do Segundo Sexo”,  “Crônicas do amor impossível”, “Amores possíveis”, “Diário do desassossego”, “Dois” e “Faraway” – recomendo que acompanhem e obtenham mais informações sobre as obras primas do super poetamigo no blog pessoal dele; eis o link: https://sergioprof.wordpress.com  ).
Comemoremos esta marcante data deixando nossos olhos leitores penetrarem (e serem penetrados) pelos mais que fodáticos poemas de Jardim!

trago na alma o inventário das andanças,
palavras proferidas no deserto das planícies
que percorrem um tempo incontestável.
entre as árvores e as montanhas, a história,
o milho semeado e colhido.
a cana, o cacau, o tabaco, o trigo, o café.
entre serras e pampas o voo das mariposas
é uma prece debaixo dos olhos do deus católico.
ouço tuas sílabas de encanto.
américa.

desfilo meu enredo andarilho,
passo a passo rumo à alvorada.
quantas trilhas, quantos limites!
a travessia ao anoitecer no titicaca,
as cordilheiras dos andes aquecidas pelo sol
e a noite debaixo do céu de macchu picchu.
as águas de el nino vem inundar o passado
e tudo chega como um oceano de saudade
por todos los amigos e los hermanos.
américa.

doze de outubro,
mil quatrocentos e noventa e dois.
passos a ecoar pelos becos seculares
de quito e de la paz.
ainda não ouvi tudo quanto queria ouvir,
derramo o cântaro de minhas lástimas
sobre tuas feridas abertas.

lembro-me da fascinação do teu corpo
nascido da utopia, cenário manchado pelo suor
de negros homens no canavial
ou amarrados ao tronco, a chibata a ecoar
em suas costas, os campos semeados
e a esperança tatuada em tua pele.
o perfume da terra cultivada,
nos seus frutos germinava o encantamento
e nossas pálpebras se abriam para um novo dia.

américa que vivi,
entre risos e o pranto, o esplendor de tenochtitlan.
a américa primeira,
asteca, maia, inca e guarani,
a américa mãe,
sangrada por cortez e pizarro.
a pátria de todos nós,
a heroica pátria de bolívar
pilhada e consumida
pelas garras dos tiranos.
vi tuas casamatas abertas
e as densas trevas que caíram sobre ti.
vieram os anos de chumbo,
os labirintos de dor e as atrocidades.
na penumbra morreram todas as flores.

canto a liberdade asfixiada,
pronunciando nomes como médici, somoza, fidel, pinochet
e seus rastros homicidas naqueles dias amordaçados.
canto as valas comuns,
as ossadas do atacama,
os esqueletos do araguaia.
meu réquiem é para os desaparecidos,
meu canto é para os filhos da ditadura,
para os sobreviventes e suas cicatrizes,
para as viúvas e os órfãos.
para las madres de plaza de mayo
e suas lágrimas perenes.

séculos se passaram
e tuas chagas ainda emergem nos jornais.
malditos condores,
malditos generais.
canto por ti, américa, por tuas favelas,
por teus bairros miseráveis e por teus palácios,
por teu brilho ofuscado pela tortura.
américa de tantos massacres e cadafalsos,
ouço-te na voz melancólica das metralhadoras
derrubando o ultimo jagunço em canudos.
uma américa de martírios,
estrangulada em atahualpa,
esquartejada em cusco,
sacrificada em che guevara.
executada em cada prisão,
e nos rituais da morte do dói-codi.

tanto luto, tanta memória
e nenhum perdão,
um áspero clarim ao entardecer
distante, tão distante,
ressoa nos planaltos e nas cordilheiras
e hoje, em busca de si mesma
ainda abrigas o mesmo fragmentado coração.

o que te aguarda, américa?
os anos se foram, inquietantes e atrozes
restando um mundo com seu clamor colonizado.
busco em teu íntimo silêncio,
por tudo aquilo que perdemos.
meu pensamento numa oração e num lampejo,
viaja ao eldorado,
lá, muito além do amazonas, um lugar deslumbrante.
muito além do aconcágua
muito além da sombra de montezuma
e dos acordos de tordesilhas.

falo em nome desta américa indígena agonizante,
falo em nome de uma américa proletária
em nome do ouro e da prata ensanguentados.
das roupas gastas dos camponeses sobre a terra árida
e a resignação de um povo com sua misteriosa mudez,
seu grito contido que em algum lugar se perdeu,
sua fome urgente e seu sangue.
suas praças onde se erguem as estátuas dos seus heróis
falo das barriadas,
da miséria, da varíola e do frio,
falo em nome dos meninos que vendem balas nos sinais.
falo por todo discurso subtraído,
reprimido pelos fuzis, detido, interrogado, ameaçado
falo da marca da tirania encravada nas paredes
falo de uma era de desterros e torturas,
do terror uniformizado.

tenho os punhos abertos e o peito vazio.
em meu gesto de amor desesperado.
meu olhar descalço e peregrino
assistiu a nostalgia do exílio e dos encarcerados.
dos párias, dos bêbados, dos vagabundos.

caminhando pela terrível solidão branca das ruas,
pelo destino oculto das metrópoles
abre-se o itinerário clandestino das minhas pegadas
por entre as trincheiras escavadas dos meus sonhos.




beijo as pétalas da rosa.
e na minha boca
o meu amor goza.




aos poucos fui te descobrindo.
na madrugada fria como um cadáver
o aroma dos desejos.
mãos e olhos fechados,
nossos pés se encontraram
sob os lençóis.

senti teu desejo,
provei o sabor de prazer e pecado
dos teus lábios, descobri tua pele,
teus seios, tuas coxas
ao encontro das minhas.

aos poucos fui te descobrindo.
minha boca desesperada
buscava tua boca.
tua entrada molhada,
apertada, faminta;
carne contra carne.

nossos corpos se cruzaram,
descruzaram, se enroscaram
se entrelaçaram, se possuíram.
lambi o suor que te banha
e escorre de cada poro teu.

aos poucos fui te descobrindo.
mordo teus lábios,
o lamber das línguas
na sinfonia dos gemidos.
delicadezas pintaram
de arrepios as paredes,
os lençóis e as cortinas.

teu sexo úmido procurando
por meu sexo duro de desejo.
e no abismo de tuas coxas
inundei teu âmago
com o doce do meu leite.



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