Capa da coletânea "Quixote-Sama e outros contos fantásticos" |
Já faz mais de um mês que aconteceu, mas o
memorável evento permanece na memória e encontra lugar cativo na minha
trajetória literária. Na segunda-feira, dia 10 de setembro de 2018, das 19:00h
às 21:00h, no Edifício Bunkyo, 1.º andar, Rua São Joaquim, 381, bairro da
Liberdade, São Paulo-SP, tive a honra de participar do lançamento da antologia
do II Concurso Bunkyo de Contos, sob o título “Quixote-sama e outros contos
fantásticos”, organizado pela Comissão de Atividades Literárias – Seção de
Língua Portuguesa da Sociedade Brasileira de Cultura Japonesa e de Assistência
Social.
A coletânea reúne 30 contos selecionados (e – yeah!
– o meu conto “Confissões de Leminski” está entre os textos classificados para
compor a antologia) dentre 171 inscritos por autores radicados nas mais
diversas cidades do país, e também na Inglaterra, Portugal e Japão.
Paulo Leminski em caricatura de Ramon Muniz |
Capa do livro "Vida - 4 biografias", escrito por Paulo Leminski |
O conto,
como o próprio título informa, é uma homenagem ao Mestre Poeta Samurai Paulo
Leminski e traz um encontro imaginário entre o escritor brasileiro e o poeta
japonês mestre dos haikais Bashô, um dos maiores influenciadores da poética
leminskiana (no livro “Vida – 4 Biografias”, Leminski chegou a dedicar um
capítulo de ensaio-lírico-estudo-biográfico todo para Bashô – por sinal, usei
este como material de estudo para o início do processo de estruturação do conto).
Foi uma cerimônia informal, lírica e festiva, na
qual tive a honra de conhecer novos e fodásticos escritores artistamigos, Não
posso reclamar, amigos, este ano de 2018 tem sido literariamente maravilhoso!
Em agradecimento a todos os amigos leitores pelas
vibrações poéticas positivas e torcida pelo meu crescimento literário neste ano,
hoje compartilho o meu conto fantástico publicado na coletânea (não posso dar
um exemplar da antologia a cada leitor, então torno público o conto como uma
forma de presentear os amigos leitores seguidores do blog)! Boa leitura e Arte
Sempre!
Confissões de Leminski
Carlos Brunno Silva Barbosa
Eu era apenas Paulo quando o
encontrei pela primeira vez. Antes de conhecê-lo, eu estudara a etimologia do
meu nome e lamentava que me nomeassem por uma palavra que significava
“pequeno”. Como todo jovem tolo, eu trazia um orgulho gigante e me envergonhava
de ser chamado de “pequeno”. Eu era apenas Paulo e temia ser apenas Paulo pela
minha vida inteira, quando o encontrei pela primeira vez.
Em
minhas viagens solitárias pelas matas desertas de minha cidade, encontrei-o tão
solitário quanto eu. Era um senhor com feições asiáticas, sua imagem traduzia
aquela complexidade simples de um velho sábio, filho de um Japão distante e
ancestral, imigrante pacato de minha agitada Curitiba. Como eu, veio buscar a
rara paisagem tranquila de minha cidade e, diferente de mim, parecia ter
encontrado o que jamais alcancei: a paz dentro de si mesmo.
Esse
velho senhor observava os sapos no brejo e seu olhar parecia dar vida ao
aspecto moribundo daquele lugar, onde tantas vezes eu me escondia do rodamoinho
de gente e, às vezes, até de mim mesmo. Ele parecia gostar das coisas pequenas
e simples da natureza. Talvez este tenha sido o motivo pra logo reparar na
minha presença: o eu apenas Paulo, o eu que me remoía por ser chamado de algo
que significava pequeno.
Observou-me
por um longo tempo, como se me desenhasse em seus olhos. Depois se apresentou:
“Olá, rapaz, meu nome é Bashô. Qual é o seu?” Minhas memórias me traem nesse
momento, não sei direito como me comportei diante daquele estranho de português
tão claro e, ao mesmo tempo, carregado pelo sotaque estrangeiro. Guardo sempre
a lembrança de um sorriso incontido que lhe ofereci, talvez por timidez, talvez
por achar engraçado que o nome dele se parecesse com a palavra “baixo” se eu
falasse com o mesmo sotaque que ele. Não sei, não me lembro bem, mas, seja como
for, o sorriso incontido, real ou ilusório, se manteve em minha memória e assim
permanece sempre que conto para alguém essa minha história.
Sei
que, em seguida, lhe revelei meu nome: Paulo. Mas, pelo tom de repulsa que fiz a
minha denominação, era como se eu dissesse algo que me diminuísse: Paulo,
apenas Paulo! O velho parece ter lido em meus lábios toda minha ira contra a
palavra que me nomeava, então comentou que vários amigos dele mudaram-se para
uma grande cidade que possuía o nome de um santo homônimo ao meu: SÃO PAULO. Ao
ouvi-lo reproduzir com tom tão grandioso a palavra que eu carregava com
vergonha desde o meu batismo, comecei a ter dúvidas sobre o verdadeiro
significado de meu nome. O velho voltou
novamente seu olhar para os sapos no brejo e comentou, quase que sussurrando,
como se me ensinasse um segredo milenar: “Não deveríamos ter vergonha dos
pequenos, pois neles está o que há de mais grandioso nesse mundo”. E me declamou pequenos poemas, segundo ele,
de sua autoria, escritos no saber de observar o que era imenso no que parecia
pequeno. E os versos curtos ganharam meus ouvidos como se fossem extensos,
infinitos! A partir daquele momento,
tudo que me parecia breve ganhou o terreno colossal de uma eternidade. Eu não
era mais apenas Paulo, estava imenso, espalhado por todo aquele matagal, ao
lado daquele velho japonês, meu mais novo amigo, agora não mais tão estrangeiro
assim.
Perdi
as contas de quantas vezes passeei por aquelas matas com o Sr. Bashô, aprendi
muito com aquele velho senhor, tanto que passei até a dividir com ele a
tradição de criar pequenos poemas. Hoje acrescento ao meu nome Paulo o
sobrenome Leminski, não por vergonha do significado de meu primeiro nome, e sim
por tentar entender e estender o grandioso que há no pequeno que agora caminha
feliz comigo nas minhas andanças solitárias pelas estradas de um novo agora,
sempre acompanhado pelo espírito de meu amigo Bashô, que sempre me visita no
caminho. Apesar de não mais pertencer ao mundo dos vivos, Bashô permanece
comigo, admirando a beleza grandiosa do pequeno infinito.
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