Trago, mais uma vez, só que numa versão inusitada e em formato de
clipoema (yeah, voltando às edições de vídeos poéticos experimentais), um poema
que escrevi, em 1998, chamado “Beijo cibernético (1998)”, inspirado nos eventos
que ocorreram naquele ano (a estabilidade econômica em detrimento da busca de
uma igualdade social, a ascensão da globalização e da internet, a defesa do
candidato a presidente Enéas pela fabricação da bomba atômica made in Brasil,
as propagandas de Disque 0900, a estranha derrota da seleção brasileira para o
time da França na Copa do Mundo, o desemprego em alta, as metas sufocantes do
Fundo Monetário Internacional [FMI], a trágica queda do prédio Palace II da
Construtora Sersan do deputado Sérgio Naya, a fissura por notícias sobre as
bolsas de valores, início de recessão, etc - sim, incrédulos coxinhas, o Brasil
governado pelo PSDB também tinha crise, recessão, apagão e deputado corrupto
agindo impunemente).
O poema, todo em tom imperativo, é uma leitura irônica dos noticiários
da época e foi premiado, em 1999, com o 4.º Lugar na Categoria Poesia Moderna
do III Concurso Internacional de Prosa e Poesia da Sociedade de Cultura Latina
do Brasil (SCLB) de Mogi das Cruzes/SP. Algum tempo depois, publiquei o poema
em meu quarto livro "O último adeus (ou o primeiro pra sempre)", de
2004.
No clipoema que produzi, o poema fica ainda mais caótico, narrado pela
voz mecanizada da voz do Google Tradutor (em duas línguas: em português, em tom
mais alto, e em inglês, mais baixo, pra aumentar a ironia caótica e
globalizadora), com acompanhamento musical da vibrante canção "Soul
Blues", de Gabriel Carvalho, Paulo Roberto Gonçalves "Paulinho
Graveto Old Style" e Davi Barros, gravada no Estúdio Black Cult (o vídeo,
com a canção na íntegra, pode ser visto).
Abaixo publico mais uma vez o poema, já publicado, em maio do ano passado, no blog, compartilho o novo clipoema e o vídeo "Soul Blues", do Estúdio Black Cult.
Traduzamos em poema, música e vídeo o caos nosso de cada dia, amigos leitores! Arte Sempre!
Beijo cibernético (1998)
Aposte, invista na crise
pois ela cresce mais que a ação
pare a ação
ligue-se na internet
sinta o site
mande um e-mail
solidaoarrobapontocompontobr
conte bytes caso não consiga dormir
especule o movimento
beije seu software
tecle enter pra amar
invista no desemprego
desfile no enredo do FMI
jure sobre os juros
reze pro prédio não cair
vote eletronicamente
confirme a clonagem
encha o disco
desligue o aparelho de CD
disque 0900
faça um curso de inglês
passe a bola pro francês
que a taça agora é dele também
desista do português
porque esta língua está em baixa na bolsa de valores
conte-me como foi sua primeira vez
na cama com Bill Gates
globalize o coração
delete a consciência
privatize suas emoções
venda sua poltrona
compre à vista uma bomba atômica
escolha o filme que escolheram pra você
aperte play pra explodir o vídeo-cassete
observe se seus três filhos estão bem
a tevê, o celular e o computador
obedeça a ordem
deixe que o progresso faça o resto
provoque um curto-circuito
aproveite a queda de energia
pra anular o comando esquecer
acesse o banco de dados
e finalmente perceba:
a única máquina que respira em sua casa é você.