Mais uma vez retorno ao blog após um longo período de ausência; mais uma vez vocês me perguntarão se está tudo bem, enquanto o genocídio nos (des)governa, enquanto os antiéticos presidem Comissões de Ética, enquanto os corruptos corrompem a justiça, enquanto a liberdade de expressão é estuprada por discursos de ódio, enquanto Hitler sorri em sua nova moradia no céu de bíblias corrompidas, enquanto a morte, a tristeza, as doenças incuráveis e as violências explícitas e implícitas desfilam por todas as rodas e moinhos desse tempo louco chamado contemporaneidade (a música “Crônica”, dos Engenheiros do Hawaii, atemporal, repete seu refrão como um disco arranhado: “Você que tem ideias tão modernas/É o mesmo homem que vivia nas cavernas”). Não, amigo leitor, não está nada bem e aquela frase – “I can’t breathe” (“Eu não consigo respirar”) – ecoa em novas bocas, em novos velhos contextos, em novos velhos lugares.
Refletindo sobre todo o mal que nos ronda, me recolhi mais uma vez. E como é difícil e, por vezes, ilusoriamente inútil, retornar do poço sem fundo que nos metemos (ilusoriamente, pois a resistência, a persistência, a arte ainda é muito útil para nossa sufocada existência apesar de toda a sua aura de aparente inutilidade). Mas, mesmo com o ar rarefeito, mesmo quase moribundos, nós voltamos.
E, desta vez, eu volto, nós voltamos com uma solidão poética compartilhada marcante... Há pouco tempo – para ser mais exato, em 24 de fevereiro, a querida, jovem e hipertalentosa poetamiga Andressa de Oliveira, de Teresópolis/RJ, me enviou um poema novo (não recebia escritos novos dela desde que ela havia deixado de ser artistaluna da Escola Municipal Alcino) que reflete bem os problemas contemporâneos do ‘estar bem’ diante do nossa nova realidade, do anormal novo normal de nosso problemático cotidiano. O magnífico poema “Bem?”, de Andressa de Oliveira Silva, que trago hoje nas Solidões Compartilhadas do blog, tem o formato dos poemas de Álvaro de Campos: como os versos deste famoso heterônimo do mestre poeta português Fernando Pessoa, os versos da jovem e hipertalentosa artistamiga primeiramente se controlam e, depois, vazam do espaço limitado da folha do verso, transbordando emoções gradativa e intensamente em uma lírica quase-prosa de desabafo, com uma maturidade impressionante e mensagem tocante. Vale ler e reler o poema de Andressa, percebendo todas suas nuances (dos questionamentos enérgicos ao transbordamento de raivas e lamentações até a melancólica elegia inquisitória).
Leiamos o magnífico poema de Andressa de Oliveira Silva e reflitamos, amigos leitores. Que nosso novo velho retorno seja firme, que realmente fiquemos e desejemos bem a nós mesmos, aos próximos e aos distantes.
Bem?
Estar bem, estar bem com você mesmo
Estar bem com seus amigos e família
Estar bem fisicamente emocionalmente e espiritualmente.
Por que é tão difícil ficar bem?
Por que não consigo socializar com ninguém? Por quê? Alguém me diga!
Será algo nas pessoas: elas são o problema ou eu sou?
Será eu a causa interna e externa?
Será que eu e minha crises atrapalham?
Se sim, por quê?
Por que que eu não durmo a noite o incomoda,
Por que meus soluços e choros lhe interessam tanto?
Você não se importa se eu estou bem, se eu falo que estou bem mesmo você vendo as marcas espalhadas pelo meu corpo e lágrimas em meus olhos, você apenas diz “Que bom” e vai embora.
Você não liga para o meu bem ou mal estar.
Você só se importa quando ouve a notícia de que alguém se foi e fala:
- Ela era tão legal - mas não falava com ela
- Era tão bela - mas só julgava ela
- Se foi tão nova - mas ela lhe dava sinais de que estava mal.
Esse “tudo bem” que ela falava, você vai ver que era mentira, mas não quis insistir.
Ela só queria que você insistisse um pouco mais para ela desabafar.
Ela só queria alguém para que ela pudesse contar sem receber nenhum julgamento.
Mas agora não importa mais, ela finalmente está em paz.
Ela agora está bem, só que não entre nós...
Poema de Andressa de Oliveira Silva
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