sábado, 19 de março de 2016

Análises Quixotescas Contemporâneas: Líder do PQP finalmente se pronuncia sobre a crise política no Brasil

Escultura de Dom Quixote
 (roubartilhada do link:
 http://www.artmajeur.com/files/amorelli/images/artworks/650x650/1588201_escultura-Dom-Quixote.jpg)
Por muito tempo, o blogueiro que vos fala evitou os assuntos contemporâneos que envolvem esse estranho planeta chamado Brasil – neguei-me a falar sobre esse inédito terceiro turno das eleições brasileiras, torci o nariz discretamente para as possibilidades de um segundo impeachment de presidente (diferente do primeiro, mais forçado por possuir uma espécie de criação condicionada de provas contra a nossa aparente governante maior) num período tão curto na História do país, observei preocupado, como um bom covarde de direita não envolvido no triste cenário corrupto caótico, o crescimento de manobras um tanto nebulosas para a restituição das forças conservadoras no poder e fiquei, como grande parte dos covardes de esquerda não envolvidos no triste cenário corrupto caótico, em cima do muro, esperando a tempestade passar. O problema que a tempestade não passa, não vai passar, enquanto não houver uma solução trágica – seja qual lado que articulá-la, esquerda, centro ou direita, qualquer solução será trágica, pois quem manda nesse caos todo, há tempos, são os poderosos, os que realmente governam este país (‘poder do povo’ é ‘meuzovo’; nenhum governante – seja de esquerda, centro ou direita – está preocupado conosco e, como os poderosos também cagam e andam pra eles, enquanto estes governarem pra deixar tudo como está, nada muda, por pior que esteja). Agora, nesse momento cutucados com vara curta – ou seja, em um cenário de crise econômica sem data prevista para acabar, questão que pode significar perda de lucros assombrosa -, os poderosos pedem, com rigores ditatoriais, aos roteiristas do espetáculo democrático um final de tragédia: ou o governo morre assassinado pelos seus ‘inimigos’ ou se mata. E o enredo para o final não importa aos poderosos – se terá viés forçado, fascista, ou romântico, pelo ‘bem da democracia’ -, as bolsas subiram porque especulam que o governo vai cair, então ele deve cair e pronto, quem aposta alto não aposta pra perder, 'fudeu' a porra toda, o final será trágico, seja qual for, e não é por causa da corrupção ou da busca de solução de problemas socioeconômicos milenares, tudo é por causa das apostas cada vez mais insanas do impassível e ao mesmo tempo cruel mercado econômico. Para os poderosos, não importa a corrupção ou a falta desta naquele que está sentado na cadeira presidencial (na verdade, todos sabemos como a ausência de corrupção é utópica, uma vez que todo ser humano é cada vez mais corruptível num sistema de busca selvagem por lucros, inclusive você, leitor, e eu, que usamos uma série de programas piratas para estarmos aqui conectados e parcialmente informados sobre toda essa loucura); para os poderosos, importa se o Robin Hood às avessas* (que rouba mais dos pobres para dar mais aos ricos) está exercendo corretamente esta maquiavélica função ou se já está desgastado demais para o papel e precisa ser substituído por outro Robin Hood às avessas. (Opa, agora, mais uma vez, abro um parênteses para evitar más interpretações: 1) Dilma é sim o Robin Hood às avessas da vez e não tivemos ainda em nossa história [e creio machadianamente que jamais teremos] alguém ‘eleito’ ou ‘colocado’ que não exerça esse papel [a menos que queira ser eliminado antes de a tragicomédia estrear para o grande público], ela só vai rodar porque sua interpretação no papel está desgastada e os poderosos – diretores da porra toda – acham melhor assim, a menos que ela consiga uma apresentação milagrosa e quase impossível; independente disso, ela, como todos os seus antecessores, está simplesmente exercendo o mesmo papel de outrora; 2) Sim, qualquer um que entrar vai ser o Robin Hood às avessas, deixemos de romantismo; desde o surgimento da democracia – criada com o significado de poder do povo apenas por estratégia genial de marketing - os poderosos sempre tiveram controle sobre os votos e decidem, de tempos e tempos, se darão uma imagem mais cretina ou mais romantizada do processo ‘democrático’ – negamos religiosamente isso como um dogma pra não nos conscientizarmos de nossa quase total inutilidade na marcha política, afinal, como todo figurante, queremos ser reconhecidos como grandes atores também, apesar que o papel que nos é dado continue sendo de figurante, ontem, hoje e sempre; 3) E também sim, os poderosos querem e vão continuar ganhando – no mundo do Capital, o Maior Capital sempre vence o menor capital, independente do que se conceitua como Bem e Mal; inventamos pequenas vitórias para nós, a plebe rude, porque todo ser humano possui o mecanismo do sonhar para não se atirar do décimo andar do primeiro prédio que encontrar; 4) E pior que sim, sou pessimista, porque a conjuntura é péssima e os poderosos que comandam evoluíram e estão cada vez mais péssimos – ser pessimista, mais que especulação, no momento, é o infeliz sinônimo de ser consciente e realista).
No caos de ânimos acirrados para ambos os lados (que, repito, são lados de uma mesma moeda imperialista), talvez o leitor procure em meu discurso uma tendência que me aloje na direita, no centro ou na esquerda – adianto que meu partido é o PQP, Partido Quixotesco Poético, e sabemos que ninguém foi e jamais será eleito nessa legenda partidária (por sinal, a arte, a cultura pouco importa em qualquer cenário, pois quem manda e quem sempre mandou nesse mundo é e sempre foram os poderosos e a arte sempre foi vista como mera distração e/ou incômodo menor, um ingrediente insólito e necessário, por isso sempre há ministério da cultura, secretaria de cultura, mas o poder deles é insosso; o poderoso o vê como lazer ou como uma máquina frágil de resistência que pode ser sucateada com um estalar de dedos e cada vez mais é menos valorizada pelo povo [e, mais uma vez, sem romantismos: se o povo valoriza menos a arte agora é porque os poderosos querem que a valorizem menos; quando estes últimos cismarem de valorizá-la mais {o que é muito difícil, pois a arte parece fazer voto de miséria, ou seja, completamente sã para os verdadeiros valores, mas objeto subjetivo perdido, rejeitado e ignorado pela cabeça do poder}). O que eu quero dizer com tudo isso (inclusive com os muitos pares de parênteses, colchetes e chaves) é que os troços e destroços de hoje, com os espetáculos de manifestações ‘populares’, prós e contras de impeachment, são capítulos traçados da nova velha guerra de poder e são montados e exigidos pelos poderosos milenares para dar maior dramaticidade às suas brincadeiras de especulações da bolsa e render um final trágico inexorável que vai render mais para eles e que, independente de qual fim final os roteiristas escolherem, o povo vai estar sempre ‘fudido’, pois independente de qual personagem for o protagonista, o papel é o mesmo: será um Robin Hood às avessas e abraçará os humildes para ficar mais próximo do bolso do povo.
A presidente (presidenta é ‘meuzovo’, com todo respeito a neologismos, este é um tanto desnecessário, por mais machistas que sejam as posições de poder) Dilma não é heroína ou mártir – é uma atriz que desempenhou o papel de Robin Hood às avessas e não agradou, não rendeu ao ibope, o que quer dizer que é vista como azarona no circo das especulações financeiras e vai rodar ou não vai rodar por isso, sendo corrupta ou não (fato que, já confessei machadianamente, utópico, pois somos todos, em pelo menos algum segundo da vida, corruptíveis). Sua manobra de colocar o Lula, investigado pela Operação Lava-Jato, como Ministro dela, poderia facilitar um julgamento mais rápido – afinal o ex-presidente seria julgado logo pela última instância – e evitar a novela-espetáculo a qual o juiz Sergio Moro estava escrevendo -, mas foi uma tentativa tardia e forçada de melhorar sua interpretação na tragicomédia escrita pelos poderosos (no primeiro governo dela, por sinal, ela, ignorando conselhos de outros atores mais sábios, também tentou uma apresentação inédita, diminuindo o poder do PMDB e este lhe deu de presente grego o cavalo de Tróia Eduardo Cunha como presidente da Câmara). Lula não é herói nem mártir – é apenas um ator que já desempenhou brilhantemente de forma ilusoriamente popular o papel de Robin Hood às avessas, que agora é de Dilma, mas que perdeu espaço entre os novos espectadores-especuladores, que não curtem reprises duvidosas e desejam um ator diferente, um rosto novo para fazer o velho papel de Robin Hood às avessas. Como todo ator consagrado e depois rejeitado, Lula convoca a plateia antiga, mas quem escala os atores não é o público e sim os diretores – os poderosos – e estes já não apostam mais nele (a menos que ele comprove rentabilidade maior na bilheteria, mas, proibido de entrar no palco, esta é uma opção inócua e também impossível, que, por enquanto, só serve para atirar às trincheiras um exército de torcedores desesperados com o rebaixamento iminente às peças de segundo escalão).   Sergio Moro não é super-herói – é apenas um ator mais convincente, enaltecido pelos roteiristas dos poderosos para acelerar o clímax da tragicomédia, e merece aplausos da plateia pelo xeque-mate que deu na protagonista ao divulgar as conversas pelo telefone grampeado de Lula, personagem e ator quase completamente condenado da nova realização da milenar peça tragieconômica. O verdadeiro papel de Moro no enredo não é voar pela cidade salvando as pessoas e lutando pelo bem maior – apenas foi um ator brilhante, que curte bastante os holofotes efêmeros do eterno justiceiro de aço, e descobriu no drama-judiciário-espetáculo uma forma de destacar seu personagem e tomar o protagonismo da nova versão da tragédia. O que dói nessa interpretação de Moro é seu ar megalomaníaco, que acaba atirando parte do público de encontro aos torcedores do exército considerado adversário, e, me perdoem, isso não faz dele um super-herói, mas sim um daqueles reis que, sentado confortavelmente em seu trono, guia os seus cavaleiros fiéis para ataques sangrentos a alvos ímpios determinados em prol de operações que teoricamente enfraquecem os atuais protagonistas do caos, mas que escondem alianças com novos protagonistas do caos. Os atores coadjuvantes do Legislativo são menos heróis ou mártires que todos os outros anteriores – são atores preocupados em se manterem no espetáculo, por isso veem com os roteristas – os poderosos – o que fazer: retirar a protagonista (leia-se impeachment) e pôr um novo ator mais talentoso ou (opção mais trabalhosa, ou seja, mais execrada) pedir uma revisão (leia-se diminuir o marasmo legislativo e votar reformas que satisfaçam os adoradores do Robin Hood às avessas) que permita um destaque para uma atriz já desgastada. Os coadjuvantes do Legislativo são tão responsáveis pelo fracasso da nova apresentação da tragédia quanto a protagonista e até possuem uma caracterização mais repugnante que esta, mas, como atores medíocres, querem é salvar seus papéis.  Em resumo, ninguém é herói, mártir ou vítima, é só mais uma peça do gênero tragédia que tanto agrada os clássicos diretores (leiam-se poderosos de ontem, hoje e sempre). Tanto faz o final do espetáculo, pois o rendimento está garantido com ou sem bom entretenimento, os protagonistas sempre serão os Robins Hoods às avessas (os atores mudam, mas ninguém toca no roteiro da peça) e que vença a melhor aposta, o especulador poderoso mais poderoso.
E é nesse ponto que chego ao olhar do PQP (Partido Quixotesco Poético – não vote na gente; a legenda já foi fundada fundida pra se fuder): no romance “Dom Quixote”, de Cervantes, numa das desventuras do alucinado, lírico e sonhador protagonista, Dom Quixote, o Cavaleiro da Triste Figura, confunde um bando de ovelhas com um exército poderoso de soldados e atira-se pateticamente contra elas a ponto de tropeçar e se arrebentar todo (por sinal, essa cena pode ser assistida na hiperinteressante versão-monólogo “O incansável Dom Quixote”, magistralmente interpretada pelo ator Maksin Oliveira [tive o privilégio de ser um dos “desocupados espectadores” dessa maravilhosa peça, apresentada ontem, no Teatro do Sesc/Teresópolis]). Depois da violenta investida vã e mesmo sendo lembrado por Sancho Pancha de que o tal exército não passava de um bando de ovelhas, Dom Quixote mantém uma versão louca de que uma bruxa transformou as ovelhas em soldados e, depois do ataque, transformou os soldados novamente em ovelhas. E aí o leitor me pergunta: “E daí? Está chamando a gente de quixotescos?” Não, caros amigos leitores, o olhar quixotesco, como eu já disse, é o meu. A grande pergunta quixotesca minha é: ao ver as ovelhas como soldados, Dom Quixote havia dado mostras de loucura ou de lucidez? Atores da tragédia já ensaiada e bruxos da mídia de todos os lados – esquerda, centro, direita -, coreógrafos dos diretores – dos poderosos – não declaram, mas veem e sempre viram a plebe plateia como ovelhas que podem funcionar como soldados para dar um ar interativo ao espetáculo. O problema que, diferente do episódio de Dom Quixote, nós somos ovelhas-soldados atacando umas às outras em todo espaço que nos é congestionado, enquanto os pastores do caos – com todos os duplos significados – nos observam de longe, ganham e continuam ganhando muito, enquanto se divertem, como bons tiranos romanos, com nossos duelos na arena. A tragédia já está ensaiada, amigos leitores, e, seja qual for o final, será trágico para nós e beneficiará sempre o surgimento ou ressurgimento de mais um Robin Hood às avessas. Só peço a mim mesmo e a todos nós o fim desse Romantismo (escola literária do século XIX, aparentemente não superada, mas já bastante arcaica) desmedido, visto ora com ingenuidade de ovelha, ora com armas de soldado; que continuemos buscando as causas perdidas, mas, por favor, que não tornemos a tragédia mais sangrenta – esquerda, centro ou direita tá pouco se ‘fudendo’ com a gente que se fode todo dia -, divergências de utopias fazem parte, mas não transformemos as ruas em arenas, não sangremos por aqueles que jamais sangraram por nós, como se tais fdp de esquerda, centro ou direita fossem mártires ou heróis (eles nunca foram e, me dói dizer, amigos do PQP, nem nunca serão, a menos que os alienígenas – os donos do poder, os poderosos – algum dia [ah, doce e cansada utopia!] nos aceitem como seres do mesmo planeta que eles). Seja qual for o final, sempre perdemos e estamos cansados de saber (dá até dor de cabeça lembrar disso e buscar um lado pra se refugiar, mas é uma merda em outra merda, escolher defender qualquer lado que não lhe defende é apenas mais uma maneira de se drogar, se anestesiar). Só não se matem, amigos leitores, não nos matemos em vão, nem estraguemos a liberdade de pensar diferente, não façamos como os poderosos que já trazem uma tragédia única, uníssona, há séculos, só mudando os seus fantoches-atores; é a única coisa que eu, como líder da PQP que paradoxalmente nada lidera sem liderar nem mesmo o nada, peço: paz (que seja paz pensada, e não medo) – que a tragédia ensaiada tenha um final menos sangrento para nós, culpados sonhadores inocentes que jamais foram historicamente inocentados. Não gosto desses temas sisudos, até porque despertam fúrias adormecidas e são vítimas de diversos e perigosos fanatismos, mas precisamos acordar para a outra vida – a que vai muito além de uma simples (porém gravíssima) rixa e crise política: a sobrevivência e liberdade de nós mesmos, como seres pensantes, tentando manter dignamente nossa existência num mundo governado por seres poderosos que se acham de outro mundo e só nos usam e maltratam em suas tragédias ensaiadas.

*A ideia sacana de se considerar Robin Hood por roubar mais os pobres para dar mais aos ricos foi apresentada pelo protagonista inescrupoloso do filme "O Capital" (2012) de Costa-Gavras.

2 comentários:

  1. Meus mais sinceros aplausos ao texto, e as mais sonoras vaias a todos os envolvidos nessa peça de teatro interminável e macabra. ( Não a do Dom Quixote, e sim a do poder.)

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  2. Meus mais calorosos aplausos ao texto. E as mais sonoras vaias a todos os envolvidos nessa peça interminável e macabra. (Não a peça do Dom Quixote, mas a do poder.)

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