terça-feira, 16 de abril de 2013

Refrão de bolero, bolero com Ana, Ana com diplose


Essas noites estáveis de outono sempre me lembram a canção “Refrão de Bolero”. Essa canção, composta por Humberto Gessinger, líder da banda gaúcha Engenheiros do Hawaii, marcou minha ‘aborrecência’. Ouvia a música incessantemente e ficava imaginando como seria Ana, a personagem amada pelo eu lírico da canção, o que seriam os “lábios” – “labirintos” de Ana. E a melodia me arrastava para bares, lugares melancólicos como essas noites pálidas de outono, onde eu encontraria, em algum momento, um bêbado lamentando sua difícil relação com uma tal de Ana.
Foi nesse período de aborrecência também que comecei a me dedicar à poesia e a estudar as figuras de linguagem, os recursos estilísticos que enriquecem os escritos líricos. Num dos diversos livros didáticos que minha madrinha, a tia e professora Celeste Cicchelli, me presenteava, encontrei uma figura de linguagem chamada anadiplose. A anadiplose consiste na repetição da última palavra ou expressão de uma oração, frase ou verso no início da seguinte, com intenção de realce. O que mais me chamou a atenção nessa figura de linguagem, na época, foi o fato de a palavra ser iniciada com “Ana”, como a musa da canção “Refrão de bolero” (até hoje não perdoo Humberto Gessinger por ter suprimido o nome dela nas últimas interpretações ao vivo da canção) e também por que a anadiplose era uma figura de linguagem marginalizada, secundária, pois os professores do ensino médio (na minha época, chamado de 2.º Grau) dificilmente a citavam. Inspirado na anadiplose e na Ana de “Refrão de bolero”, construí, nos meus primórdios poéticos, o pequeno poema abaixo, publicado mais tarde em meu quinto livro “Eu e outras Províncias”, de 2008.
Curiosidade: na época, criei até um pseudônimo (nome falso, um disfarce poético): Gessinger Gardel – em homenagem ao líder dos Engenheiros do Hawaii e ao cantor argentino de tango Carlos Gardel – apesar de o nome da canção ser “Refrão de bolero”, a música sempre me lembra um tango rock rs.
Em tempo: o poema “Ana (diplose)” faz parte de meu set list poético e será declamado ao vivo no Sarau Solidões Coletivas In Bar do dia 20 de abril, às 19 h, na Boite Mr. Night, em Valença/RJ, comemorando um ano do sarau.
Que vossos olhos dancem nos labirintos de Ana (diplose), amigos leitores.

Ana (diplose)

Você é minha
Minha vulgaridade íntima
Íntima desconhecida
Desconhecida amada
Amada sem palavras
Palavras caladas
Caladas mas ainda ditas
Ditas por entre as portas fechadas
Fechadas por seu coração
Coração sombrio
Sombrio mas ainda vivo
Vivo nos gestos
Gestos vazios
Vazios por serem tímidos
Tímidos por serem contidos
Contidos pelas portas fechadas
Fechadas por seu coração...


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