quarta-feira, 31 de outubro de 2012

Contos medievais: O triste fim do gato da Bruxa do 71

Hoje é dia de Halloween, hoje é Dia das Bruxas. Em homenagem a isso, posto um mini-conto inédito meu, que reflete um pouco sobre as caças às bruxas e demônios na Idade Média. Dedicado a Anny Lucard, do programa "Contos sobrenaturais", da Rádio Digital Rio de Jacarepaguá (acompanhem as novidades deste rico e assombroso gênero narrativo no link: http://contossobrenaturaisdigitalrio.blogspot.com.br/ ), que incentivou essa produção minha mais gótica.
Bons pesadelos, amigos leitores!


O triste fim 
do gato da Bruxa do 71

Era um tempo de muita fome e de muita imaginação. Era um tempo em que a liberdade matava gatos.
Linda Blair sempre trocava carícias autoritárias com Tom, o gato da vizinha. Cansado daquela paixão sufocante, Tom arranhou as mãos imundas da horrível menina.
No dia seguinte, Linda adoecera e seus pais insanos creditaram a enfermidade ao “gato maldito da bruxa do 71”. Mataram a dona do animal, cuja única bruxaria era a misantropia, e emparedaram vivo o felino para protegerem suas crianças da presença malévola do gatuno.
Enquanto Linda acordava da gripe passageira, Tom padecia em sua liberdade eternamente desfeita...

segunda-feira, 29 de outubro de 2012

Luz, câmera...Alcino! apresenta "Os cegos do castelo"



"Os cegos do castelo - Ilusões e perigos na rota dos vícios" é um curta-metragem produzido pelo "Luz, câmera... Alcino!", dirigido pelo professor-poeta-pateta que vos fala e atuado pelos alunos artistas da E. M. Alcino Francisco da Silva, de Teresópolis/RJ. Livremente inspirado nas canções "Os cegos do Castelo", de Nando Reis, "Dado viciado", de Renato Russo e em poemas dos próprios alunos artistas, o vídeo é um alerta aos que escolhem o mortal caminho das drogas. Possui música de abertura e de encerramento do músico valenciano Zé Ricardo, roteiro final e criação de cenas coletivos (foram criados e montados pelos próprios alunos e professor) e faz parte da Campanha Contra as Drogas nas Escolas.

Desabafo do abafo artístico no qual nos encontramos


Há algum tempo venho dando sinais de um certo desgaste no blog, mas evitava o assunto, como um raio de sol tenta desviar das nuvens negras. Mas as nuvens negras não passam e provocam estrondosas tempestades dentro e fora de meu universo coletivo particular.
Às vezes, me pego perguntando qual é o objetivo de fazer, transmitir arte hoje em dia. Você não vai alcançar o mundo, muitos abraçarão sua causa em facebooks e outras redes proliferadoras de fakes intelectuais, mas quando realmente olhar à sua volta contará nos dedos aqueles que compreendem os caminhos e descaminhos da rota artística coletiva. Às vezes, mando um foda-se pras dúvidas e apenas sigo em frente, louco pra não enlouquecer com tanta lucidez absurda. Mas, isso é só às vezes, muito às vezes. Na maioria dos momentos estou me perguntando, me auto-questionando, a partir de questionamentos de outros que pouco se auto-questionam – eles são o que são e ser o que são lhes significa ter suas posturas e conceitos estanques pra poderem me mandar rever minhas posturas em eternas metamorfoses. De tanto me questionar, descobri que o meu questionamento sobre arte estava completamente equivocado. Comecei com a pergunta errada: a discussão não está na arte; está em nós mesmos, os artistas questionadores. Vejo artistas pregando a criação de um universo cultural mais amplo e mais justo, enquanto seus versos aumentam centímetros de desigualdade no muro artístico entre ele e os outros, que estão tentando fazer uma arte diferente da dele. Sou metralhado várias vezes por aliar trash metal a bossa nova no mesmo sarau, como se os gêneros musicais vivessem cada um em sua trincheira particular. E o que mais me emputece nisso tudo: enquanto a metralhadora está apontada pra mim, nem o trash metal, nem a bossa nova têm espaço algum nos planejamentos e programações culturais.
Outros alvejam o blog, dizendo que “muitas vezes” publico “obras artísticas sofríveis e sem qualidade”. Então chego a outro ponto: o que é qualidade? Segundo os padrões do início do século XX, Lima Barreto era um escritor de bosta, que maltratava a língua portuguesa. Hoje o cara é visto como um visionário e teve as portas da literatura abertas por Monteiro Lobato, um dos mais questionados escritores do passado na crítica contemporânea. Um escritor modernista é avaliado como péssimo por classicistas e vice-versa, os trovadores em sua maioria julgam-se acima dos poetas como se a literatura e a arte fossem um termômetro que se move de acordo com a análise parcial de cada um.
Uma vez, num congresso, ouvi um sonetista me dizer que não entendia o valor absurdo que dão a Drummond, só por causa de um “poema chato da pedra no caminho”. Perguntei ao crítico se ele conhecia a “Máquina do mundo”, “Elegia 1938”, “José”, as rimas internas, o padrão rigoroso dos versos ‘sem rigor’ de Drummond. A resposta foi “humpf” ignorante e ele permaneceu na tese de que Drummond escrevia conversas e não poemas, pois estes deveriam ser metrificados segundo o método sonetista (versos decassílabos, rimas, 2 estrofes com 4 versos e 2 estrofes com 3). Resumindo: Drummond – que ele nem conhecia direito – era um poeta de merda para aquele sonetista. Me vejo sempre criticado por postar poemas meus e de outros autores numa tentativa de diversificar gêneros e estilos (sempre falha, é claro, sou tão pateta quanto qualquer outro autor que se propõe organizar o que traz o sublime caótico da arte), criticado por quem jamais tentou isso ou o fez de forma bem seletiva segundo critérios narcisistas. O incrível é que as mesmas pessoas que falam em qualidade rejeitam qualquer associação com fascismo e ou nazismo – transformam gêneros, autores e estilos literários diferentes deles em ratos que devem ser isolados e executados em campos de não literatura e matam futuros grandes artistas sem dó por não condizerem com o sistema de qualidade que as mentes críticas alucinadamente criaram. As mesmas pessoas que pregam esse fascismo e/ou nazismo literário clamam pelo apoio coletivo e pela peregrinação em prol da arte livre – que deve seguir, é claro, as algemas de qualidade que eles impuseram. E o que mais dói nisso tudo: enquanto os lados se ignoram e se segregam, o espaço artístico coletivo continua esmagado pela indiferença daqueles que desfazem de toda e qualquer forma artística.
Resumindo: enquanto os artistas se alvejam, se segregam, se torturam, se debatem, se masturbam com suas visões estanques de arte, a arte continua alienada da maioria esmagadora da população. Resumindo mais ainda: enquanto elegemos quem é o melhor, quem é o mais foda, quem é o mais desprezível, não há possíveis eleitores para escolherem o partido. Sendo curto e grosso: os artistas estão em guerra por uma terra que não existe!!! Em suma: estamos sumindo, por não assumirmos as nossas indiferenças com as diferenças artísticas dos outros. Não estou dizendo que não há textos ruins, e sim em como estamos separando-os e como há muita falta de autocrítica em nós mesmos. Já escrevi muita porcaria, sei disso. Passo dias em claro relendo alguns de meus poemas, me perguntando onde errei; leio e releio os textos de outros autores que posto no blog, pensando no que devo analisar deles, o que selecionar, qual é o momento, bato cabeça com meus próprios pré-conceitos. E sempre haverá um roxo que odiará o amarelo, por esta cor não fazer parte dele. Em nome da qualidade indefinível (ou seja, ter padrões artísticos diferentes dos dele), lá vai mais um texto para o campo de concentração dos ‘inaceitáveis’ pelo bom gosto particular. Enquanto isso, a poesia contemporânea e outros gêneros artísticos, admirados pela crítica ‘especializada’, nunca foram tão herméticos e tão impopulares (não confundir com impopulista, por favor) quanto nos tempos atuais. Brincamos de oróbulos, estamos comendo a nós mesmos, cachorros caçando o próprio rabo. E não me venham com aquele papo de super-homem, de que ‘só os selecionados’ darão valor a nossa arte cheia de pré-conceitos. Vou te contar quem são os selecionados: nossa família, um ou outro puxa-saco de sobrenomes pomposos e meia dúzia de seletos amigos. E aí é que está a foda mal tirada: do lado de fora desses selecionados tem uma porrada de escritores e leitores em potencial que estamos ignorando por ficarmos nos rachando em prol da qualidade pré-concebida. Me lembro dos versos de “Beautiful”, de Cristina Aguilera (sim, é pop, não é nenhum Alfredo Bosi, e daí? E se eu não tivesse te informado a autoria, hein?):

“Não importa o que fazemos
(não importa o que fazemos)
Não importa o que dizemos
(não importa o que dizemos)
Nós somos a música dentro da melodia
Cheia de erros bonitos
E para onde nós formos
(e para onde nós formos)
O sol sempre brilhará
(sol sempre brilhará)
Mas amanhã a gente poderá acordar
No outro lado

Porque nós somos bonitos não importa o que eles disserem
Sim, palavras não vão nos fazer cair
Nós somos bonitos em todos os sentidos
Sim, palavras não vão nos fazer cair
Então, não me faça cair hoje"

E o blog segue seu caminho. Como bem diria a poeta fodástica Janaína da Cunha, somos a mesma estrada, cada um com suas devidas retas e curvas, e o caminho está bonito demais. Precisamos mesmo é de carros leitores e não de semáforos nas pistas vazias. E isso tudo só foi mais um desabafo de alguém que tem sido bastante questionado por quem não se questiona demais. Enquanto as pedras são pra minha expressão artística, aceito de bom grado. Mas quando os alvos são outros artistas com quem divido o espaço, me jogo na frente (dizer: “quem não tiver nenhum pecado que atire a primeira pedra” não funciona para os donos de verdades absolutas). Depois de um tempo apedrejado, é preciso um instante de desabafo. Tava meio de saco cheio (esperamos sempre ataques externos, não da nossa classe; a porrada dói pra caralho). Já foi. Passou. Agora seguimos em frente. E, por favor, não me faça cair hoje.  

quarta-feira, 24 de outubro de 2012

Beatles Bashô na Engenharia Poética: Haicai do Sonho que não terminou



Inspirado no amor da amiga Marilda Vivas por essa forma poética e influenciado pelo “Sarau Solidões Coletivas In The Sky: Um Batpapo com os Beatles” - que realizaremos amanhã, às 19:30, no pub “Bar Batpapo”, em Valença/RJ, hoje posto o meu primeiro haicai para os amigos leitores. O haicai, como bem nos ensina a Wikipédia e a minha amiga Marilda Vivas, é uma forma tradicional poética, de origem japonesa, formada por três versos – o primeiro e o terceiro com 5 sílabas poéticas e o segundo com 7 sílabas poéticas -, cuja temática costumeiramente é ligada a elementos da natureza, simplicidade e pequenas pílulas poéticas de sabedoria oriental. Meu haicai, assim como meus poemas, começam inspirados no bom e velho rock’n roll e são uma mistureba só: inspirado na contracultura das décadas de 1960/1970 e na popular frase de John Lennon (“The dream is over”, ou seja, “O sonho acabou”, pensamento citado diante do fim da banda The Beatles), dei um título ao haicai, feito incomum nessa forma tradicional poética; inspirado nos Beatles, associei um elemento da natureza (‘o vento’) aos principais integrantes da banda (John Lennon e Paul McCartney); inspirado em Engenheiros do Hawaii, subverti o verso “Afinal o que é rock’n roll: o óculos do John ou o olhar do Paul”, da música “O Papa é pop”, composta por Humberto Gessinger – na minha (sub)versão, a morte de Lennon culmina na associação dos dois símbolos do rock citados pela música em Paul, ainda vivo e mantendo acesa a chama dos eternos Beatles.
Boa leitura, amigos leitores! Arte sempre!

Haicai do sonho que não terminou

O vento deixou
Os óculos de Lennon
No olhar de Paul.

terça-feira, 23 de outubro de 2012

Solidões a dois: Outubros e outubros, por Gilson Gabriel e por mim e por todos nós

Gilson Gabriel e eu,
nos traços de João Paulo Maia

Passadas algumas eleições (algumas localidades do Brasil ainda encararão o segundo turno) e nada ou quase nada muda: os mesmos eleitos, as mesmas caras, as mesmas muitas suspeitas de compras de votos por muitos políticos eleitos, tudo que nos deixa com aquela sensação de que todo outubro de eleição nos fornece quatro anos de iguais desolações; ainda somos os mesmos e ainda votamos como nossos pais votavam, quando podiam fazê-lo (lembrando que eles conviveram com a ditadura, muito amiga de vários candidatos e partidos eleitos atualmente).
Com base nessa reprise, o fodástico poetamigo Gilson Gabriel e eu, ambos ainda esperançosos de um futuro outubro realmente vermelho e diferente, escrevemos a quatro mãos o poema abaixo (a parte vermelha foi escrita por Gilson Gabriel, a branca por mim mesmo, em resposta às duas estrofes do poetamigo), realizando a nossa primeira coligação lírica anti-política atual.
Que outros outubros venham para nós, amigos leitores, antes que seja tarde demais!

Outubros e outubros

Lá se vai novo outubro com seus dias de escolhas
E avança a procissão aos santos bizarros e de pau oco
Uni duni tê joga no quadradinho
(não vale, é marmelada, esse já ganhou!)
Ilude-se quem joga que o jogo é limpo
E que a mesa não tem vícios.

Lança a moeda da sorte no número mais azarento
Repete a escolha de antes, não arrisca nova parada
Muda pra ficar igual, não busca original
Se espera em vão o milagreiro que não vem
E de pronto o milagre que hora alguma se faz.
Que deus qualquer nos proteja e mantenha aceso o farol
Que nosso outubro inda chega!

Olhando pra trás, se vê os outubros passados, as mesmas encolhas,
Os mesmos ombros curvados, a mesma palidez do povo
Uni duni tê os donos do jogo acham-nos divertidos
(de um até o infinito, é tudo da bancada, nós perdemos as fichas, o mestre levou)
Ilude-nos o senhor de terno em desalinho;
Parece conosco, mas não passa de um cínico.

Faz a sesta de lorde diante de nosso lerdo desenvolvimento,
Repete a refeição de outrora, somos de novo carne fatiada
Em seu curral eleitoral, somos novamente o seu prato principal
Esperamos em vão a piedade que o rico açougueiro não tem
E de novo somos presas expostas no banquete do predador voraz.
Que deus qualquer nos enrijeça e mantenha teso nosso corpo antes do corte final
Que nosso outubro inda chega antes da facada fatal! 

segunda-feira, 22 de outubro de 2012

Solidões compartilhadas: O horário de verão de João Júnior


Hoje compartilho mais uma vez solidões poéticas com o poetamigo João Júnior, cantor da banda Black Bullets. E o poema dele vem no momento mais pontual possível: o início do horário de verão, o momento em que devemos adiantar nossos relógios e, segundo o eu lírico, o momento em que devemos nos tocar de mudarmos nossos tempo, alterarmos nossos embaçados dias. O poema é uma declaração de amor ao “carpe diem” (“aproveite o dia”, em latim), é a luta pacífica por um tempo novo, independente de relógios, é a busca pelo adiantamento de nossas utopias por um tempo melhor para nossas vidas.
Encontremos esse novo tempo, leitores! Carpe Diem!

Horário de verão

Hoje à meia noite começa o horário de verão
Por favor, adiantem seus relógios em uma hora
Adiantem seus presságios
Adiantem seus litígios
Adiantem seus relógios
A diante, passem a gentileza
Deixem o bom humor acordar mais cedo

Por favor, atrasem seus relógios em uma hora de raiva
Atrasem seus relógios diante a iminência da ofensa
Atrase as línguas antes de dizer o que pensa

Por favor, parem seus relógios quando forem beijar
Ou quando o pôr-do-sol estarem a olhar
Parem seus relógios ao ver o luar

Mas hoje não se esqueçam
Adiantem o relógio
Adiantem o ócio
Adiem o ódio diante do próximo
Diante de si próprio
Não levem adiante negativos sentimentos
Não adiem bons momentos
Carpe diem enquanto há tempo
E quando o horário de verão acabar
Joguem fora seus relógios

sábado, 20 de outubro de 2012

Poema canino de sete estrofes em desordem (ou Ozzy, um labra-latas em minha vida)

Ozzy deitado ao meu lado na cama
(em breve, ele me dará uma patada
e tentará tomar meu lugar na cama)

O poema que posto hoje é uma paródia (releitura humorística) do “Poema de sete faces”, de Carlos Drummond de Andrade, especialmente dedicado ao Ozzy, o cachorro vira-latas, mestiço de labrador (tanto que engana bem e é tão destruidor e simpático quanto rs) de Isabel Cristina, mãe da minha namorada Juliana Guida Maia. Dedico esse poema desordenado, escrito na última madrugada (o danado do cachorro me acordou com uma lambida na cara) a esse amoroso cão selvagem que me morde, pula, arranha (tudo com muito amor e pouca ironia - tô falando sério) e é meu principal companheiro das minhas caminhadas pelo bairro São José das Palmeiras, em Valença/RJ.
Só quem tem um autêntico labra-latas entenderá esse poema-paródia em sua plenitude.

Poema canino de sete estrofes em desordem 
(ou Ozzy, um labra-latas em minha vida)

Quando Ozzy me deu a primeira mordida de amor,
um veterinário louco me disse: “T’aí, Carlos: o cachorro da sua vida!”

O labra-latas arrasta o homem
que arrasta o labra-latas.
A liberdade no passeio, talvez, fosse minha,
se não houvesse no labra-latas tanta força e desespero.

O labra-latas passa cheio de objetos:
panos pedras bermudas madeira livros chinelos.
Por que esse cão não sossega, meu Deus, pergunta a casa estilhaçada.
Porém minha afeição por ele
Finge que não vê a casa bagunçada.

O braço todo marcado pelas dentadas apaixonadas
é frágil, cheio de cicatrizes reabertas.
Quase grita de dor.
Tem muitos, múltiplos ferimentos
o braço todo marcado pela paixão incontida do labra-latas.

Meu Deus, pra quem esse cachorro tanto late,
se não há nenhum perigo na calçada calada,
se até a lua já se escondeu ensurdecida pelos seus latidos.

Mundo mundo mundo cão,
se o adestrasse como Cérbero
seria apenas um porteiro do inferno, e não esse inferno amoroso de canino heavy metal.
Mundo mundo mundo cão,
ao seu lado, eu mais pareço o seu animal de estimação.

Eu não deveria lhe dizer, Ozzy,
até porque você abusa dessas minhas confissões,
mas essa sua desordem,
mas esse seu amor descontrolado
deixam-me tonto e feliz como um pobre-diabo enamorado.



sexta-feira, 19 de outubro de 2012

Solidões compartilhadas drummondianas: "Poema das Quatro Fases", de Juliana Guida Maia


Hoje compartilho solidões poéticas drummondianas com Juliana Guida Maia. O poema dela que posto hoje é uma homenagem a um dos mais fodásticos poetas brasileiros de todos os tempos: Carlos Drummond de Andrade. Em seu poema, Juliana Guida Maia destaca as várias fases e faces do poeta: a primeira fase ‘gauche’, o deslocado, em que o coração dele é maior que o mundo (“mais vasto é o meu coração”); a segunda, mais comunista, na qual o poeta se volta não só a ele como aos outros ao seu redor (“A morte do leiteiro”, etc), tanto que num poema, ele desfaz o verso “mais vasto é o meu coração” e descreve que seu coração não é maior que o mundo; a terceira fase, niilista, iniciada pelo livro “Claro Enigma” (o próprio nome do livro já avisa: se o enigma é claro, ele é um nada) e a seguinte, onde ele mescla todas as três fases anteriores, somadas a resgates de memórias da infância e a celebração de toda forma de amor (inclusive a erótica, segundo o poeta, “o amor natural”).
Em tempo: O poema de Juliana Guida Maia surge em ótimo momento, pois amanhã, no Bar e Restaurante Costelão, no bairro Getúlio Vargas, em Valença/RJ, ás 18:30h, realizaremos o “Sarau Solidões Coletivas In Bar: Fazendeiros do Ar, Rosas do Povo e Claros Enigmas – Homenagem a Carlos Drummond de Andrade”, celebrando os quase 110 anos de aniversário de nascimento desse múltiplo e mais que completo fodástico poeta (Drummond nasceu em 31 de outubro de 1902 e faleceu em 17 de agosto de 1987).
Viajemos pelos universos líricos de Drummond e de Juliana Guida Maia, amigos leitores!

Poema das QUATRO FASES

O homem que vê o mundo vê um muro
O homem constrói barreiras entre  olhos e óculos
O homem ergue versos de pedras irônicas
O homem é um muro a esquerda o mundo.
(Pra que tanto mundo, meu Deus?)

O homem carrega os tijolos do mundo nas costas
O homem constrói versos para transpor pedras
O homem se enternece do mundo
O homem se enfurece pelo mundo.
(Como pesam as rosas deste mundo, meu Deus!)

O homem esvazia mundos
O homem (des) constrói enigmas niilistas
O homem versifica as pedras destruídas do mundo
O homem é do tamanho da desesperança do mundo
(A qual mundo pertenço, meu Deus?)

O homem revisita os universos de seu mundo
O homem se (re) constrói versificando a criança
O homem pulsa em nuances mundanas
O homem é múltiplo como o mundo.
(Quantos mundos cabem no seu verso, Homem!)

quinta-feira, 18 de outubro de 2012

Arte na escola: "Luz, Câmera.. Alcino!" apresenta "Perdendo Vida", de Uns e Outros



Teresópolis, 2012 - Após um tempo de ausência, o Grupo Teatral "Luz, câmera... Alcino!", da Escola Municipal Alcino Francisco da Silva, em Teresópolis/RJ, retorna com tudo! Inspirado no projeto "Faces do Brasil", da Secretaria Municipal de Educação de Teresópolis, o "Luz, câmera... Alcino!" inicia o projeto "Brasil Musical", que consiste numa série de clipes musicais, criados e interpretados pelos alunos da escola. A primeira canção escolhida pertence ao gênero balada rock e vem da Região Sudeste do Brasil: é a recente e fodástica canção "Perdendo vida", da banda carioca Uns e Outros, com participação e Bruno Gouveia, cantor da banda Biquíni Cavadão.
Sob direção do professor-poeta-pateta que vos fala e com roteiro criado coletivamente com os alunos, construímos uma história de amores impossíveis (como no poema "Quadrilha", de Drummond) para elaboração do clipe da canção.
O clipe foi filmado em intervalos de aulas e contou com excelente atuação de alunos atores do 8,º B, 7.ºA e 7.º B.

segunda-feira, 15 de outubro de 2012

A centésima solidão compartilhada: O olhar lírico de Patrícia Corrêa


Hoje o blog chega a 100.ª solidão compartilhada e, mais vez, minhas solidões poéticas estão muito bem acompanhadas: hoje divido meu espaço lírico-virtual com a poetamiga Patrícia Corrêa, de Valença/RJ. Professora e dona de uma poética extremamente emocionante e autoral, neste Dia dos Professores, Patrícia nos dá sua melhor aula de lirismo: ela nos ensina a encarar e a superar os obstáculos da vida através da poesia. Ao descobrir-se vítima de uma doença chamada ceratocone (ela pensava que sua visão sofria de hipermetropia, mas descobriu que era algo muito mais grave que isso), Patrícia Corrêa fez dois dos poemas mais espetaculares que já li. Como Cruz e Sousa e Glauco Mattoso, a escritora sublimou sua dor e a transformou o sofrimento em dois dos poemas mais belos que já li.
Pra quem não sabe, a ceratocone é a diminuição da acuidade visual (visão), proveniente do astigmatismo irregular (distorção de imagem causada pela alteração da curvatura normal da córnea). A ceratocone atinge uma pessoa a cada 2000, e, durante um período, é extremamente degenerativa, até um determinado momento em que a doença estabiliza-se. Logo após o trauma da descoberta de ser portadora de tal doença, há algum tempo atrás, Patrícia mostrou-me esses poemas que posto hoje. Guardei-os para uma ocasião especial, como toda obra-prima merece: a centésima solidão compartilhada, pra que lembremos que a solidão pode ser coletiva, jamais egoísta, como alguns artistas em redomas de falso ouro pensam; o Dia dos Professores, para que aprendamos que toda dor pode ser sublimada pela arte, que sempre existe um caminho, por mais que nosso sofrimento faça não vermos isso. Como diziam os antológicos versos de Fernando Pessoa, “Quem quer passar além do Bojador / Tem que passar além da dor.” Sim, Patrícia atravessou fronteiras do mais esmerado lirismo, viu muito além da dor que tanto nos cega.
E também aprendi muito com os artistas com os quais compartilho solidões poéticas. Sempre vale a pena compartilhar, quando a alma não é pequena. Valeu, Patrícia Corrêa. Vale viajarmos cada vez mais pelas ondas da poesia, amigos leitores.

Cegueira

Estou cego
De um olho só
Estou cego
De metade de mim
Estou cego
De um olho cego
Estou cego
De significado
Estou cego
Do olho direito
Estou cego
Do que também é esquerdo
Estou cego
Da parte que sente
Estou cego
De gente que diz apenas um
Estou cego
Da vida que virá
Estou cego
De tudo que vejo
Estou cego
Dentro e fora
Estou cego
Da parte que falta
Estou cego
Do inteiro
Estou cego
Estou cego
Estou cego
De não ver que
Estou cego
E estando cego
Cedo ou tarde não importa
Será sempre noite
Que nunca amanhece.

 ...Talvez somente o cego de um olho só seja capaz de se utilizar desse olhar para quem não vê, para ler nas entrelinhas do poema, que não basta enxergar, é preciso ter visão...

Ansiedade...

Sim
Sinto sono
Sinto fome
Sinto frio
Sim há sede
Sei meu nome
Sou eu mesmo
Sou vazio
Só na cidade
Sinto saudade
Sem realidade
Só solidão
Sim senhor
Seu doutor
Sem remédio
Só há tédio
Sem eu mesmo
Só há dor
Sem sanar essa dor
Só me resta...
Sensação desilusão
Sem verdade
Sem lamento
Sinto muito... mas já vou.

domingo, 14 de outubro de 2012

Velhos poemas juvenis da fossa nossa de cada dia: Poema do depois do adeus


Há pouco tempo conversava com uma jovem colega no chat do facebook e ela me contava sobre seus problemas amorosos com o ex-namorado. Ela achava que não gostava mais dele, mas ele agora estava com outra pessoa – uma conhecida dela – e aquela velha dor-de-cotovelo adolescente atingiu a minha colega em cheio, provocando-lhe uma certa irritação e desespero. Lembrei-me de meus 16 anos e minha tendência poética à fossa: sim, minha aborrecência foi um vasto laboratório de desastres amorosos, beirando os trágicos ultrarromânticos; colecionei minhas desventuras românticas com arte e os transportei para o papel, antes que me explodissem por completo. Tudo isso, somado à influência de baladas românticas rock de 80 e de Roberto Carlos (músico que ouvi intensamente na infância, pois meu tio João Gomes idolatrava o cara e tocava todas as fitas – e, mais tarde, todos os CDs - do Rei incessantemente em nossos passeios de carro), acrescentado a micos das crises de dores-de-cotovelo da adolescência, gerou o “Poema do depois do adeus”, publicado em meu segundo livro "Promessas desfeitas" (1997) e mais conhecido como o ‘poema em que o eu lírico com dor-de-corno que abraçava postes’ (quando eu bebia, ainda muito jovem e cheio de ‘sofrimentos no coração’, realmente terminava abraçando postes, reclamando da crueldade das ex-amantes de minhas trágicas e parcas relações amorosas aborrecentes). É clara nos versos finais do poema a influência da canção “Estupidez”, de Roberto Carlos, na época recém-ouvida na versão e voz do titã Paulo Miklos (Cd “Tributo ao Rei” – já quase sequestrei essa obra musical das relíquias de meu tio João, mas nunca tive instinto corrupto político para fazê-lo e resisti à tentação). Não há nada mais dramático - beirando o tragipatético - que um adolescente sofrendo dores de amor.
Em tempo: Minha namorada Juliana me contara que sua prima, na adolescência, recebera de um ex-pretendente frustrado uma carta com o poema que eu posto hoje (yeah, dores solitárias compartilhadas rs). Foi o primeiro contato que ela teve com minha obra poética.
Num dia friozinho e com ares melancólicos como esse domingo, relembremos nossas angústias aborrecentes, com todas qualidades e defeitos, e deixemos a fossa nossa de cada dia sorrir e se libertar em poesia mais uma vez, amigos leitores.

Poema do depois do adeus
(tudo o que eu quis dizer e você não quis ouvir)

Eu ontem abracei um poste
Por um momento pensei que era você
O poste era tão frio que pensei
Que era você...
Mas a ilusão acabou
O outro lado da rua revelava
Seu corpo abraçado com outro
Do outro lado da rua eu vi
Seu corpo
Mas não sua alma...

Você viu meu sofrimento
Você sorriu
Como se trouvesse ganhado
Um jogo que nunca existiu
Mas eu a conheço
Sei quais são os seus pontos fracos
E se hoje estou pra baixo
Quero que saiba
Que todo o que o seu coração faz
O seu coração paga.

Pode até chamar de tolice
Mas eu acredito em tudo que sinto
Pois meu coração é um absorvente
Que suga todas as bobagens
Da novela das seis
Que suga todas as bobagens
Que você me disse
Que suga a esperança
De que um dia você vai voltar
E descobrir que nunca mais
Será sempre tempo demais
Pra nós dois.

Talvez essa poesia não faça sentido
Pra quem não sabe sentir
Talvez essa poesia não faça sentido
Pra você.
Não a culpo...
O seu coração novato
Deve estar tão acostumado
A fazer os outros sofrerem
Que não consegue ver
Que tudo o que eu quis dizer
São coisas que sua estupidez
Não consegue ouvir.

quinta-feira, 11 de outubro de 2012

Giz 2: Para aqueles Renatos que morrem em mim sem morrer

Renato Russo, em desenho
de Gabriel Henrique.
Veja mais desse desenhista em:
http://www.flickr.com/photos/gabrielhenriqi/

Hoje faz 16 anos sem Renato Russo e nunca vi um ídolo falecido tão vivo em mim. Faz muito tempo que o ouvi na primeira vez: eu tinha entre 10/11 anos; um amigo roqueiro precoce me emprestou uma fita das “Quatro estações”, da Legião Urbana, e aquele k7 mudou minha percepção de mundo – o lobisomem juvenil me intrigava, gostar de meninos e meninas era uma concepção de amor completamente inédita e inusitada para meus olhos infantis, ouvir os paradoxos de Camões com trechos do Coríntios em “Monte Castelo” deu um nó em minhas sensações e saber que eu precisava amar as pessoas como se não houvesse amanhã me acordou para o desespero lírico de abraçar o mundo como se fosse a última vez. E assim, ainda muito novo pra compreender da forma adequada todo aquele amor e desespero, as músicas de Renato Russo criaram ninho em minha árvore poética ainda imatura. Quando despertei para a poesia escrita, eis Renato Russo dormindo em minha arte; meu poemas têm muito dele, não se pode negar o que está mais que evidente (como se eu quisesse negar o que me faz tão bem e, pra ser honesto, só um pouquinho infeliz).
Por esses motivos, sempre faço uma homenagem a Renato Russo. Por esses motivos, continuo o “Giz” que Renato Russo iniciou. Que esse giz, essa arte nunca se acabe dentro de nós, amigos leitores. Legião Urbana Omnia Vincit, a Legião Urbana Sempre Vence! Arte sempre!

Giz 2
(Para aqueles Renatos que morrem em mim sem morrer)

E mesmo sem você
Parece que suas palavras desenhos
Vão indo bem...

Em toda calçada, eu vejo o seu sol de giz
Que a chuva de sua ausência não apagou
Queria até que pudesse ver
A sua música em mim
Viva
Confesso que um pouco infeliz
Mas infinita

E tudo bem, tudo bem...
Lá vem, lá vem
De novo
Aquela sua canção a me envolver!
Tudo bem, tudo bem...
Parece morto
Mas não vai morrer!
Tudo bem, tudo bem...
Acho que o infinito gosta de você!
Tudo bem, tudo bem...
Sim, e é de você que eu não me esquecerei...
Tudo bem, tudo bem...



terça-feira, 9 de outubro de 2012

Solidões Compartilhadas: Um poema a se pensar, de Jéssica Ribeiro dos Reis


Hoje tenho a felicidade de compartilhar pela primeira vez minhas solidões poéticas com a jovem teresopolitana Jéssica Ribeiro dos Reis, de 16 anos, aluna do 9.º ano da E. M. Alcino Francisco da Silva, local onde atualmente eu leciono.
Há uma felicidade tripla nessa solidão compartilhada. A primeira felicidade está no próprio conteúdo e rico ritmo do poema de Jéssica Ribeiro dos Reis. Como ‘aconteceu’ há tempos atrás com um eu lírico de Carlos Drummond diante do seu cotidiano (em “Poema que aconteceu”), a jovem poetisa, sempre preocupada com a musicalidade de seus poemas (nesse caso, ela me lembra mais os poetas simbolistas e místicos pós-anos 1922), nos traz um poema que se despe de preocupação com sentidos e/ou pretensões maiores e simplesmente traduz uma esperança oculta diante do cenário natural que a artista vê. Essa é a segunda felicidade que ela me traz: ler seu poema nos traz uma misteriosa esperança nesses tempos de incertezas. Poucos poetas conseguem me trazer isso sem parecerem superficiais, poucos poetas conseguem o feito deste poema que aconteceu a Jéssica Ribeiro dos Reis. E, assim, vem a terceira felicidade: ver a poetaluna amadurecendo, as solidões artísticas cada vez mais coletivas, o blog crescendo a cada compartilhamento.
Há tempos, Jéssica me pedia, já com muitos méritos, um espaço no blog, mas os que acompanham esse espaço virtual há tempos e me conhecem um pouco sabem o quanto tento ser criterioso nas escolhas (passível de erros, é claro, afinal haverá um critério subjetivo nisso, o que nos lembra que não há seleção perfeita na arte. Sei que sempre haverá algum narciso puritano que não vê qualidade na arte alheia aqui compartilhada, mas, nas solidões coletivas, o que impera absolutista é a busca do olhar coletivo, as mil formas e estilos que a solitária arte [que está para, em e é de todos nós, e que não para em poucos escolhidos, como alguns artistas evangelizam] pode, comunitariamente, oferecer aos olhos do mundo, caso o universo dispa-se de modelos autoritários de olhar as obras artísticas).
Leiamos, amigos leitores, o reflexivo poema de Jéssica Ribeiro dos Reis e deixemos essa misteriosa esperança entrar, levemente, a pensar...

Poema a pensar

A pensar eu estava, enquanto tomava um ar
Em uma pequena rampa
Observando um pássaro a voar.

Eu estava sentada e dizendo pra mim mesma:
- O que está acontecendo com essas pessoas
Que parecem não saberem amar umas as outras?

Às vezes fazemos coisas sem pensar,
Algumas boas, outras ruins,
Mas o que importa é consertar.

Agora vejo uma árvore linda,
Ela é alta e tem folhas verdinhas
Pois é! Alguns não sabem, mas é ela que nos dá vida.

Eu agora estou triste por dentro
Pois acabei de pensar que não sou nada,
Mas tenho esperança no que estou escrevendo.

Eu não sei, mas sinto que algo vai melhorar;
Será que vem daqui? Não sei. Pode ir e vir de qualquer lugar,
Apenas não sei ainda, só sei que estou a pensar...


Meu filho-poema selecionado na Copa do Mundo das Contradições: CarnaQatar

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