terça-feira, 17 de abril de 2012

Poema camponês massacrado na falta de terra e de lirismo

Hoje, dia 17 de abril, comemoramos o Dia Internacional da Luta Camponesa, ao mesmo tempo que lamentamos o aniversário de 16 anos do Massacre de Eldorado dos Carajás, que deixou dezenove sem-terras mortos e vários fazendeiros, ilustres senhores da terra inculta, impunes pelo planejamento de tal crime. Desde os primórdios dos tempos, os camponeses, os sem-terra lutam por um espaço nos campos dos poderosos e autoritários latifundiários; há tempos, luta-se por uma reforma agrária, por uma divisão justa de terras, porém tal reforma é tão pouco lembrada, é tão injusta, quanto o veredicto dado ao Massacre de Eldorado dos Carajás, ocorrido em 1996; como diria Renato Russo, os assassinos estão livres, nós não estamos... Pra jamais esquecer, pra um dia realmente poder comemorar o Dia Internacional da Luta Camponesa deixo aos leitores um poema, escrito 10 anos depois do Massacre de Eldorado dos Carajás (a impunidade neste crime estimulou diversos poderosos a cometerem outros massacres a sem-terras que ousavam cultivar em campos férteis da pátria amada [e, dependendo da sua posição social, nem sempre amante] Brasil) e inserido às pressas em meu quinto livro "Eu e outras províncias" (2008):

Relatório alienígena sobre os sem-terras brasilis

Eles nascem na Terra, aquele estranho planeta
repleto de seres que não conseguem ser
alguém. Estranhas formas de vida
esses seres não-seres,
esses ninguéns são eles,
sem-terras brasilis.
Crescem na esterilidade da injustiça agrária
e, quanto mais as terras da Terra se estendem,
mais eles se comprimem e se multiplicam
feito fantasmas.
Fantásticos espécimes,
eles habitam a Terra-Ideia, a Terra Ideal,
enquanto caminham pela terra-impossível,
a terra-excesso de poucos-donos,
a terra-negação.
Com suas enxadas invisíveis,
eles aram os morros da imaginação,
colhendo fritas de ventos, verduras de sonhos,
legumes de ausências,
enquanto a terra cresce majestosa, indiferente;
a terra da falta, a Terra que falta,
a terra enterra a Terra dessa espécie misteriosa.
Então eles morrem,
viajam para outro mundo mais justo,
segundo os mitos da tribo,
mas - irônica vitória - seus corpos moribundos
fertilizam o solo brasileiro abandonado.
Finalmente eles possuem a terra negada. 



 

Um comentário:

  1. É o que gente poderosa, mas não inteligente, deixa aos que lhe proporcionam alimento, contributos fiscais - porque estes têm que haver!!! - e tudo o mais, que as imaginações desses "poderosos" congeminarem!
    Mas tenho esperança que alguém com real poder e real inteligência intervenha na mudança!

    Tudo de bom!

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