quarta-feira, 30 de novembro de 2011

Solidões compartilhadas: "O cheiro" que permanece em Vívia Teixeira


Hoje tenho o privilégio de compartilhar minhas solidões coletivas com a talentosa e ainda inédita (!) escritora Vívia Teixeira, professora que conheci no dia a dia letivo na E. M. Alcino Francisco da Silva, onde lecionamos (lembrando postagens anteriores: foi ela que revelou para o mundo mais um talentoso poeta infantil – quem não lembra ou não leu esta história segue o link: http://diariosdesolidao.blogspot.com/2011/10/presencas-que-brilham-mesmo-no-escuro.html). Outro dia, conversávamos sobre poemas; sabendo que ela era uma descobridora de talentos, imaginei que também fosse poeta, então convidei-a a produzir um poema pra esta seção do blog. Ela deu-me um sorriso-incógnita quando lhe fiz a proposta e fiquei sem saber se ela toparia ou não dividir os seus escritos íntimos com os leitores.
Surpresa minha foi abrir minha caixa de mensagens do facebook no dia seguinte e deparar-me com um maravilhoso poema escrito por ela. E não era só um maravilhoso poema: era sim um maravilhoso poema com uma história tão rica e lírica quanto o próprio escrito.
Revirando papéis do passado, entre livros e mais livros de professora de Língua Portuguesa, começando a se preparar para a mudança (a escritora se casará em breve), ao dar uma faxina geral nos livros da época do magistério, Vívia encontrou uma poesia dela feita na noite seguinte à morte de seu pai. Encontrara o poema dentro de um dos livros remexidos, bem na página do “Soneto do Amor Total”, de Vínicius de Morais (detalhe: trechos desse soneto estarão escritos no convite de casamento da escritora). Vívia chegou à conclusão que esse fato não acontecera por acaso, acreditou que foi obra de seu pai, querendo mostrar que está por perto, que está feliz por ela e essa crença extremamente poética aumentou dentro dela, a ponto de mandar-me o poema para aprovação.
O pai de Vívia
O poema, dedicado ao pai, que fora “fumante durante 37 anos , alcoólatra durante 20 e o dono do maior coração” que ela já conhecera, foi escrito por Vivia, aos 20 anos (hoje a poeta está com 30 e, mesmo após tanto tempo, é como se visse seu pai inspirador “exatamente daquela forma”, confessa a escritora) com o coração cheio de dor. Seu poema é um misto de elegia (poema melancólico, quase sempre dedicado a pessoas falecidas), ode (poema quase sempre eufórico que exalta os feitos de uma determinada pessoa, colocada com status de herói no conteúdo da obra lírica) e obra ‘meio-neo-concreta-neo-modernista-com-um-estilo-próprio-que-cativa’. Meus olhos ficaram fascinados com a obra poética enviada por Vivia e, a todo tempo, me vem à imaginação a figura fantástica desse homem, desse pai, descrito pela poeta. Destaco a forma sutil como ela descreve o cheiro – típico em fumantes – na primeira estrofe, os jogos e loops sintáticos nas memórias afetivas que o eu lírico traz do pai nas estrofes seguintes, a penúltima estrofe concreta feita só com substantivos pra desencadear o verso final - uma súplica desesperadamente explosiva e impossível de ser atendida diante da partida do pai.
Diante de tudo isso, busquei ser o mais cuidadoso possível com a postagem dessa solidão poética compartilhada por Vívia, pois é uma obra de raro requinte, mista de dor, euforia, amor e desespero, cuja história de composição traz tanto lirismo quanto o seu conteúdo. Espero que a poeta Vivia Teixeira aprove a forma como fiz a postagem desse poema tão significativo pra ela e agradeço a confiança dela nesse blogueiro-poeta que vos fala. Dedico essas solidões compartilhadas a todos os leitores admiradores de artes raras e conhecedores daquelas dores que permanecem sorrindo em nosso peito durante muito tempo.

"O cheiro ainda está
Antes desejava diferente
Agora o desejo é ser do jeito que era
Jeitos.... todo um jeito pouco meu
Jeitos.... todos seus

Medo... muito medo naquele olho

Sim sim o amor que só o silêncio por muitas vezes mostrava estava lá .

Estava lá quando a bicicleta caiu, o dedo sangrou e o curativo curou...
Quando na prova não passou, o boletim assinou e a bronca levou ....
Quando o cigarro entregou, naquele olhar implorou, o coração apertou.... e como apertou...

Quando... quando... isso passa???
Melhor que não passe....
Fica!!! Não sai de perto de mim saudade!!!
Você sempre vai trazer ele de volta pra mim.

Olhar
cheiro
silêncio
medo

Eu quero te ajudar!!!”

(Vivia Teixeira)  

5 comentários:

  1. Oi amigo ...muito emocionada aqui!!!
    Ficou ótimo.
    Porem vc errou a fotinha de papai rsrsrsrs esse é meu avô , o pai do meu pai, que tbm já se encontra ao lado dele.Mas adorei!!!!

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  2. Foi mal o furo, poetamiga Vívia! Ajustei a postagem e inclui a foto de seu pai que você me enviou. Mesmo assim, preferi manter também a de seu avô. assim fica toda família reunida pra admirar o grande talento da sublime poeta, filha e neta!

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  3. Vívia, Professora-Poeta! Quantas memórias queridas, que surgem na dor. O Carlos Brunno é um despertador de poetas. Logo Alcino inteiro estará contagiado, escrevendo suas emoções, releituras e memórias. Parabéns pelo texto, amiga!

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  4. Um belíssimo poema mesmo Carlos. me lembrei de meu avo, que por sei tamanho em relação ao meu, era um gigante fisicamente, mas era maior ainda no sentimento que nutria por mim. uma pena que na época eu nao sabia entender os sentimentos

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